A chuva outra vez
Sinto que a umidade me puxa para dentro em dias assim. Meu interior eu vejo como se do fundo de um aquário. Aquelas imagens obtusas. O sonho da noite que passou, rasgou meus dedos quando a manhã chegou. Eu passei a madrugada enrolando uma mecha dos teus cabelos, pra fazer o sono vir. Mas eu, eu não dormi. Com os olhos bem abertos vivi cada minuto desse devaneio dentro do sonho.
Resisti ao dia como esse amor resiste aos anos e à espera de si mesmo. E me refiz numa realidade paralela a minha, encapsulada numa fagulha sem tempo, no espaço sem bordas nem limites dessa ausência, dessa imensa saudade que cultivamos entre nós.
Mergulhei, mais uma vez, nas paredes azuis da sala. Teci com palavras a confusão das imagens noturnas, atando fortemente as linhas dessa catarse absurda – um pano quente sobre o meu e o teu silêncio. Uma veste pra guardar teu cheiro dentro. Pra esconder o rosto acima da linha que traçamos com pontos de fuga – linha reta para o esquecimento.
A umidade eu sinto ainda. As janelas embaçadas não escondem o cinza-claro deste dia. Antes de a noite chegar, a chuva vai nos trazer pra perto, outra vez.