O DEDO QUE NÃO TINHA AMADURECIDO

Numa quarta-feira perfeitamente comum, tão comum quanto qualquer outra quarta-feira, eu senti uma dorzinha enjoada na ponta do dedo indicador esquerdo. Algumas horas depois, o dedo começou a inchar e ficou cabeçudo.

– Uma cutícula inflamada... – pensei.

Porém, passados três dias, o cabeção do dedo estava maior que cabeça de cearense. Na noite de sábado resolvi tomar uma atitude e fiz uma proposta indecente pro meu “namorido”:

– Amor, desinfeta uma agulha e tenta estourar esse “treco” na ponta do meu dedo. Acho que está inflamado.

Ele tentou, tentou, tentou... Espetou o cabeção do dedo várias vezes, mas o “treco” não estourou.

– Sabe o que é? – dizia ele – O dedo ainda não está maduro, quando amadurecer, vai estourar sozinho. Daí a infecção sai e a dor passa.

No domingo à tarde resolvi ir até o pronto atendimento do hospital. Eu estava atulhada de compromissos na semana que ia começar e caso o dedo piorasse ia ser difícil arrumar tempo para ir ao médico.

Neste ponto eu preciso abrir um parêntese para contar que no ano passado meu pai teve uns “piripaques”, levei ele para um hospital “X” e o atendimento que recebemos foi horroroso. Eu fiquei indignada da vida e ao comentar o problema com uma amiga que trabalha na área da saúde, ela explicou:

– É que você levou ele para o hospital errado. O hospital “X” atende pelo teu plano de saúde, mas ele é mais voltado pro SUS ( Sistema Único de Suicídio). Quando quiser receber um atendimento decente, vá para o hospital “Y”.

Muito bem, lembrando do conselho da minha amiga, eu, meu dedinho e meu “namorido” fomos para o pronto atendimento desse hospital “Y”.

Chegando lá, encontrei uma enfermeira e um médico de bobeira, ou seja, sem absolutamente nada pra fazer.

– Pois não senhora? Deseja um consulta? – perguntou a enfermeira

– Sim.

– Certo, o que a senhora está sentido?

Mostrei o dedinho e disse:

– Acho que ta inflamado.

– Carteirinha do plano de saúde, por favor.

Entreguei a carteirinha. Ela preencheu uma ficha, eu assinei.

– Vamos medir sua pressão arterial.

Não sei o que a merda da minha pressão arterial tinha que ver com a porcaria do meu dedo, mas tudo bem! Faz parte do procedimento.

–Treze por oito, senhora. Agora passe aqui para falar com o doutor.

Tava lá o médico, atiradão pra trás, brincando com os dedos.

– Olá, Luciana. O que há de errado?

Mostrei o dedinho de novo.

O médico fez uma quantidade infinita de perguntas. Uma verdadeira entrevista a respeito do meu “problema”.

Respondidas todas as perguntas, ele então, examinou o dedinho cabeção.

– Eu acho que isso é um abscesso ou é uma simples bolha de inflamação, vou tentar estourar.

Fomos até a outra sala, coloquei a mão em cima de uma espécie de maca e para fazer um micro corte no meu dedo, o tal médico fez questão de dar duas injeções de anestesia no cabeçudo.

Atrás dele ficou a enfermeira com uma cara muito concentrada, como se aquilo fosse uma cirurgia de alto risco.

Feito o corte, a inflamação não saiu.

– Bem, sendo assim, vou te encaminhar para o cirurgião. Amanhã mesmo você vem consultar com o doutor “V”.

– Ahã...

– Você também vai ter que tomar uma antitetânica.

– Claro.

– E um antibiótico.

– Uhum...

– Você trabalha?

– Sim, sou professora.

– Quer um atestado pra não precisar ir trabalhar nos próximos dias?

– Não!

– Vou fazer a receita.

Nisso veio a enfermeira, pegou um rolo de gaze e fez um curativo tão grande mas tão grande, que fiquei com um dedão de ET. Parecia que eu tinha amputado o dedo. E no final ela ainda me disse:

– Cuidado! Você pode ter uma hemorragia, volte aqui para trocar o curativo.

– Ahã...

Ao sair do hospital, meu “namorido” disse:

– Tá vendo? Eu falei que ainda não tava maduro. Quando amadurecer vai estourar.

Eu chorava de rir, lembrando do escândalo do médico e da enfermeira. Nunca vi tanta frescura por causa de uma ponta de dedo indicador inflamado.

Fomos até a farmácia comprar o antibiótico, mais precisamente, uma amoxicilina e lá o escândalo foi maior ainda.

Não quiseram me vender o remédio porque só uma via da receita estava carimbada, eles queriam carimbo nas duas vias. Voltei no hospital, o médico carimbou a outra via, fui até a farmácia de novo e me senti como se estivesse comprando veneno.

Além da receita carimbada em duas vias, tive que apresentar identidade, dar endereço, telefone residencial e celular, o vendedor copiou todos os dados da minha identidade na receita e ainda tive que assinar embaixo.

Nunca vi tanto fiasco pra vender uma simples amoxicilina.

Bom, tomei o remédio, mas não tomei a antitetânica e nem fui ao tal cirurgião porque eu tinha mais o que fazer na vida.

Quatro dias depois, o dedo amadureceu, a bola de infecção estourou e acabou-se a saga do dedinho cabeçudo.

Quanto ao hospital “Y”, se pela ponta inflamada de um dedinho fazem todo esse escândalo, imagina o que eles fazem quando chega alguém passando realmente mal?

Não dá pra dizer que o atendimento não seja bom. Mas foi bom demais pro meu gosto.

A Alquimista
Enviado por A Alquimista em 03/07/2014
Reeditado em 03/07/2014
Código do texto: T4867821
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