O Cálice de Lágrimas

Durante um dia comum de verão intenso, Ali caminhava pelo deserto à procura de qualquer coisa que servisse como alimento, ele costumava fazer esse trajeto pelo menos uma vez na semana, às vezes voltava para casa com alguns escorpiões, talvez uma cobra, ou, na maioria das vezes, não encontrava nada, e voltava para casa acompanhado apenas pela sua garrafa d’água e pela pobreza que estava sempre ao seu lado desde a sua mais remota infância.

Havia dias em que sua garrafa d’agua estava completamente vazia e, com isso, não se arriscava pelo ar quente e seco do deserto, optava, portanto, por pedir esmolas nas ruas mais movimentadas da cidade e voltava para casa feliz, carregando alguns pedaços de pães e algumas garrafas d’agua para dividir com sua esposa grávida, do seu primeiro filho, que tanto amava.

Na verdade, embora sua vida fosse difícil: órfão de mãe desde o dia do seu nascimento e de pai quando completou cinco anos. Desde os primórdios, Ali procurou lutar pelo o que realmente valia a pena, dizia ele: “Mas, se Deus me deu uma vida, Ele quer que eu desfrute desse presente.”. E, dessa forma, era muito raro ver Ali chorar ou resmungar devido aos males que caíam sobre ele.

Certo dia, em mais uma de suas caminhadas pelo deserto, Ali tropeçou em um cálice de prata, aparentemente comum e em bom estado. Sua primeira ideia foi leva-lo à cidade para troca-lo por alimentos e talvez por algumas moedas que correspondessem ao valor daquele cálice. O trocador, que era muito seu amigo, chamou Ali para uma conversa particular no seu cubículo a que chamava de escritório.

-Ali, meu velho amigo, você encontrou uma das relíquias mais procuradas na história do Oriente, esse cálice é o cálice envolto em lendas e histórias que percorrem todo o nosso povo letrado, esse, Ali, é o cálice de lágrimas. –Disse o trocador pausadamente.

-Cálice de lágrimas? E o que isso significa? –Ali o indagou atônito. Ele, de fato, desconhecia da história do cálice, porque nunca teve a oportunidade de aprender a ler para desvendar os mistérios dessa história nos livros das bibliotecas, assim como também não teve uma família que se reunisse sob as estrelas para compartilhar fábulas e histórias fantasiosas que tanto animavam às crianças.

-Sim, meu amigo, toda e qualquer lágrima de tristeza que cair dentro desse cálice, se transformará em pérolas e, uma vez que você foi aquele que o encontrou, ele pertence a você e não há como desfazer-se do cálice. Você é um homem de sorte, Ali.

Ali correu para a sua casa, e durante o caminho pensava em meios de ficar triste para poder encher o cálice de pérolas e se tornar rico. Durante a primeira semana, Ali viu fotos de seus pais, pensou nas tragédias que aconteceram na sua vida, e em todas as coisas que o ligavam a uma possível tristeza. E a cada pérola que ele ganhava, mais ambicioso ele se tornava.Porém, esses poucos fatos reais de sua vida não eram suficientes, Ali precisava de mais, de muito mais.

E toda aquela ambição e ânsia em ser rico o tornaram louco.

Ao verem pérolas esparramas pela calçada de Ali, saindo por baixo da porta, todos os seus vizinhos foram em direção a sua casa para ver de perto o que tinha acontecido. Seu amigo trocador estava entre eles e ao abrir a porta de Ali, ele o viu:Ali estava sentado em uma montanha de pérolas, chorando inconsolavelmente dentro do cálice, com uma faca na mão e sua esposa grávida morta em seus braços.

Lianderson Ferreira
Enviado por Lianderson Ferreira em 24/06/2014
Código do texto: T4857227
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