O milho nas festas juninas
 
           Tudo aparecia do milho, até mesmo brinquedos feitos dos grãos, das palhas ou dos sabugos. Os fregueses de Inácio Ramos lhe presenteavam sacos e sacos de “mão de milho”; com isso, alguns desses rolavam, na A Barateira, a dívida do madapolão, comprado para trabalharem na roça: tecido fofo, de algodão, branco ou bege claro, “de cor amarelada como a da lã em seu estado natural”. Muito depois, a Teoria de Planck me explicaria o que agricultores já sabiam: menor radiação solar na cor daquela roupa, abrandando a quentura nos espinhaços dos lavradores do milharal. Então, traduzindo o inglês, vi que, em tal tecido, vendido na loja do meu pai, havia, à borda do pano, repetidamente “Made in Polland”, daí, talvez, a corruptela “madinpolão”. Mas, hoje, encontra-se madapolão, em Houaiss, como originário de “Madhavapalan”, da cidade de Naraspur, na Índia, onde vestiu seguidores de Mahatma Gandhi. Então, há sentidos...
          O que não tem sentido é menosprezar o liame entre as festas juninas e o milho, tentando o inexplicável “São João fora de época”. Na infância, observava, nas feiras de sábado de Pilar, como nas terças-feiras, de Itabaiana, os sinais desses festejos: montes de espigas vestidas de palha, outras nuas nas mãos dos seus donos gritando o óbvio: “Olha o milho verde!”. Óbvio também, na nossa cultura, é o São João ser uma festa sazonal, uma comemoração da colheita do milho.  
          Outro significado está no nome do santo, o de cunho religioso, das novenas e loas, inspirando Luiz Gonzaga rezar ao “São João do Carneirinho”: “fale lá com São José para ele me ajudar, peça pra meu milho dar vinte espigas em cada pé”(...)  Dar milho verde, assado, cozido ou moído para boa pamonha, gostosa canjica, enfim cuscuz e o que comer às galinhas. Posta a mesa, haja forrós, quadrilhas e folguedos na sapateada das matutas, dos matutos, vestidos de madapolão, cáqui ou chita estampada em cores, acentuados com um chapéu de palha. Com os frutos da chuva, iniciada em março, no dia de São José, a matutice predomina nas festas juninas; excetuando o francês, trazido ao Rio, no começo do séc. XIX, pelos mestres de dança Milliet e Cavalier, na época da Regência, para comandar a quadrilha palaciana; hoje, palavreado incompreensível aos franceses que, como madapolão, de geração a geração, perdeu acentos e letras... Com o milho, tudo apareceu: folclore, lazer, prazer, na Festa de São João.