LEMBRANÇA IX
Ainda lembro-me perfeitamente dos finais de semana em que íamos para a casa dos meus avós maternos.
(Os avós paternos já haviam falecido muitos anos antes do casamento dos meus pais).
Naquela época as famílias eram, como devem ser, com status e papeis definidos pelos sexos masculino ou feminino, portanto eu tinha avô, avó, tios, tias (legítimos ou por afinidade devido ao casamento), irmã, primos, primas, padrinho, madrinha, etc.
As crianças ao se dirigirem aos mais velhos usavam o tratamento de senhor ou senhora, que era também usado com os empregados domésticos que, como os familiares, jamais ouviram a contestação muito em voga nos dias atuais: - você não é a minha mãe...
As famílias eram numerosas e na minha, por não ser exceção, quase todo domingo, meus avós reuniam mais de vinte pessoas em torno da mesa do almoço, entre filhos, genros, noras, netos, outros parentes e os agregados, num clima de total harmonia e colaboração na preparação dos pratos e também na limpeza porque a empregada tinha folga nesse dia.
À tarde, íamos a um dos cinemas do bairro de Casa Amarela, geralmente sem a companhia dos adultos, assistir à matinê cuja programação incluía o jornal, Atualidades Atlântida, que terminava sempre com uma partida de futebol do Maracanã, ao ritmo de samba; os trailers dos filmes que entrariam em exibição nos próximos dias; o desenho animado ou uma pequena comédia com os Três Patetas ou dos Irmãos Marx; o filme propriamente dito e por fim o seriado que era o chamariz para que o público voltasse na próxima semana.
Antes da abertura das bilheterias, tinha o comércio de revistas em quadrinhos ou álbuns de figurinhas de jogadores de futebol ou dos clássicos Disney, que muitos meninos levavam para vender ou trocar antes de entrar no cinema.
Por vezes o filme se partia e era uma algazarra na escuridão da sala de projeção que só cessava quando as luzes eram novamente acesas, para que os engraçadinhos, se identificados, fossem expulsos pelos vaga-lumes...
E voltávamos para casa, mastigando os chicletes de bola, que era a grande novidade da época e com a barriga cheia de pipoca, sorvete, caldo de cana, cachorro quente, amendoim torrado e cozinhado, algodão doce, pirulito, maçã do amor...
Na boquinha da noite as despedidas, com a obrigação de tomar abênção à vovó, e a promessa de que no próximo final de semana estaríamos todos lá, outra vez...