Por que tememos a morte mesmo?
Por que tememos a morte?
Temer a morte é algo estúpido
Devíamos temer a vida
Pois ela tece a nossa morte.
Viver é um morrer constante.
Não se iludas com os prazeres hostis deste presente
No passado foi assim
E todos eles se foram
Mas o que fazemos do nosso fim diário é o que realmente nos fazem felizes.
A nossa morte está no nascer do dia
E termina ao fecharmos os olhos no fim deste
Nesse meio tempo:
Sobrevivemos a tão somente nós mesmos.
Nossos medos,
Nossos traumas,
Nossos anseios,
Nossas esperanças,
Nossas covardias,
Nossas coragens
O nosso destino.
Não nos deve interessar o medo de como o “temido fim” pode chegar
Devíamos nos interessar com o que fazemos do fim que hoje realmente há:
Crianças sem escolas
Mulheres violentadas
Negros ainda sendo dizimados
Militantes torturados
Gays sendo mortos
Esperanças mutiladas.
Se tudo isso não é morrer,
A nossa finitude não passa de uma futilidade do nosso ego,
Da nossa desumana vaidade.
Insensíveis somos perante o que os nossos olhos veem
E que preferencialmente não enxergamos
Pois a morte oculta que alimentamos silenciosamente dentro de nós
Deve ter vida para que nesse eterno teatro da vida
Venhamos a estar sempre sorrindo nas fotos, nos comerciais de tv, nos portas retratos de família.
Fazendo todo esse show de personagens criados por nós nos vencer a essência
Tirando-nos a consciência.
Mentindo, vamos caminhamos.
Correndo vamos nos enganando com o que dizemos de nós mesmos
Escondendo o que há de verdadeiro e soterrado em nossos pensamentos
Maquiando excessivamente os nossos verdadeiros sentimentos.
Então, não se iluda
A morte está ao seu lado
Conduzindo-te todos os dias
Com lentos passos ou com passos ligeiros.
Tudo depende da nossa sagrada mentira
Da nossa auto-sabotagem
Dos nossos eternos medos.
Inexoravelmente ela nos devora o espírito
Quando ignoramos o que nos machuca o dia inteiro
O ano inteiro, a vida inteira.
Em vez da estética,
Não devíamos estar nos movendo para a ética?
Em vez de aplaudirmos com audiência o espetáculo da morte alheia
Não devíamos estar evitando que este grande reality show do horror continue?
Amanhã morrerão milhares novamente
Mas ao desligarmos a tevê,
Esquecemos e apagamos de nossas mentes tudo que acabamos de ver sem sentir.
Sem nada doer.
Fazemos plásticas, ginástica
Implantamos músculos, seios
Queremos ser os objetos mais desejados de nosso meio
Mas ao adoecermos,
Não recebemos visitas.
Em nosso enterro,
Palavras vazias e pessoas desconhecidas.
Estamos sós.
Sós e belos.
Para a nossa eterna solidão e angústia de existir superficialmente.
Para a nossa alegria forjada com belos rostos que estampam outdoors de marcas que só nos devoram a alma coletiva em todos os nossos extremos.
Por que mesmo temer a morte?
Se ela sempre nos pega de jeito?
Estúpidos, realmente somos
Ilusoriamente, covardemente e violentamente escolhemos nos esconder em nossas vaidades desumanas e fingimos viver.
Matando uns aos outros
Aniquilando qualquer possibilidade de uma possível subjetividade real e original
Que podia nos fazer falar e gritar em vez de obedecer a nossa economia obscura
Dizimando as nossas essências, nos perdemos de nós mesmos nestes caminhos sem rumos
De lutas sem vitórias
De desgraças gloriosas.
Extinguimos os sonhos alheios por abandonarmos os nossos.
Adoecendo a nossa amada e sagrada existência.
E assim vamos nos transformando em bonecos lindos para uma competição em que o vencedor sai infeliz e muitas vezes, já não tem outra opção.
Adoramos esses padrões que nos reduzem a meras mercadorias para a nossa própria alienação.
E mutuamente vamos morrendo coletivamente sem nos darmos conta.
Sorrindo por fora e chorando por dentro.
Tomando antidepressivos e curtindo tudo ao extremo.
Viver é agitação e aceleração.
E morrer é silêncio e desespero
Que grita lentamente,
Atirando-nos ao pior de nós mesmos.
Então,
Por que tememos a morte mesmo?