Um Sábio no Metrô
Veio à cidade apenas para encontrar o que não procurava. Veio contemplar um horizonte que sua religião não fez. Pois também não fez os edifícios que cobriram os terrenos. Não aprumou os asfaltos que cobriram uma esplanada. Não fez os recintos artificialmente naturais que parecem engaiolar as árvores que se elevam, mas são somente detalhes pormenores na zona urbana. Também os automóveis que liberam suas substâncias e diluem-se pelo ar que nos serve de vida. Também as águas, que outrem já foi correntes cristalinas, hoje são charcos e bacias cinzentas.
O antigo homem de cabelos e barbas brancas foi à estação mais próxima e hesitou um pouco a descer as escadarias. Não que tivesse medo de enfrentar a turba, mas sentia-se desconfortável em agrupar-se naquela multidão. – Pobres cidadãos – Vivem na cidade que os próprios sujam. Estão requerendo direitos que nem mesmo conhecem. E como conhecer direitos se nem mesmo se conhecem? Como protestar a um governo que tem o poder do suborno? Como exigir melhoras nas condições, se não se melhoram as ações?
O homem ficou ali parado. Naquela altura já havia decidido dar meia volta e desistir de estar por ali. Tudo era concreto demais, e ele nunca se esquecera de que seu coração era feito de matérias que não se podia tocar.
Sentiu uma corrente de ar contíguo lhe passar ao lado direito. Com o impulso e a pressa o velho homem reparou que o apressado deixou cair um envelope de papel bege e espalharam-se ao chão, várias folhas. Ao ver o desespero do sujeito em juntá-las novamente, o velho homem aproximou-se e envergou os joelhos para ajudá-lo. Após terminar de guardá-las, o sujeito que parecia ter seus trinta anos vividos, o olhou com agradecimento, mas a aflição estava exposta em seu semblante e não disse nada. Apenas virou as costas e partia em sua jornada alucinante.
- Rapaz! – Chamou-o o velho homem.
A pressa lhe consumia, mas por alguma educação e grato pelo que o homem havia lhe feito, ele não deixou de virar-se para ver o que aquele senhor queria. Apenas fez com a cabeça para que falasse.
- Me diga. – O velho aproximava-se. – Para onde está indo?
- Estou indo para o trabalho.
- Sim. E depois do seu trabalho, para onde vai?
- Ué! Depois eu vou para casa.
- E depois de casa?
- Mas... – O homem já apressado, começava a esquecer dos bons fluídos da educação, e a angústia pelo horário que parecia urgir queria lhe fazer perder a paciência e ir embora.
- Espere filho. Não precisa me responder. Sei que agora você vai para o trabalho, e depois vai para casa, e de casa, amanhã novamente vai para o trabalho. Não é isso?
- Sim. É isso mesmo.
- Agora me diga filho: qual o caminho que você segue?
- ‘‘Qual o caminho’’? O senhor quer saber em qual estação eu vou descer? Por acaso vai me seguir?
- Não filho. Eu não perguntei o seu itinerante, e sim o seu caminho?
- Mas que caminho? Já disse. Vou para o trabalho, e depois para casa, e amanhã é o mesmo!
- Está errado filho.
- Errado?! Olhe, o senhor me dê licença, porque eu estou atrasado. Tudo bem?
Sem fazer nenhum sinal, verbal ou ação para que o sujeito ficasse, o velho o olhava partir e adentrar no rebanho que seguia para o embarque. Quando, em um ato inesperado, o rapaz parou e virou-se novamente para o homem. Veio até ele.
- Espere aí senhor. Por que disse que a minha resposta estava errada se eu disse o caminho que faria?
- Como pode ter me dito o seu caminho, se você nem o conhece?
- Como?!
- Nós nunca sabemos o que vamos encontrar no caminho que resolvemos seguir, sempre é um mistério, por isso a vida é mágica. E é sempre em linha reta, como o tempo, nunca volta para trás. E o que você me disse é completamente o contrário. Você sabe exatamente o que vai acontecer, e nunca é em linha reta, sempre dá voltas e você cai nos mesmos lugares, como se andasse em círculos. Por isso ainda não conhece o seu caminho.
O ancião virou às costas e foi embora. O homem fez o mesmo. Talvez tenha entendido, talvez não. Talvez fosse um velho mentecapto, ou talvez um sábio resolvesse agir entre os homens. O certo é que o sábio sabia, e como sabia saber.