Fechem a Porta

Por favor,

Fechem a porta!

Deixe-me viver esta morte que me quebra, me parte, me rasga, me desencanta e me bate violentamente.

Então, por favor!

Fechem a porta.

Tudo escureceu de repente dentro de mim.

Eu não quero existir.

Não posso cumprir minhas obrigações agora.

Deixem-me em paz.

Deixem-me aqui,

Sozinho em minha inação,

Não existindo ou morrendo por acúmulo de todas as dores de existir.

Apaguem todas as luzes.

Os demônios me querem assim, no escuro.

Os anjos se afastaram de mim.

Estou à mercê desses fantasmas que insistem em me derrubar

Fazendo-me cair num abismo sem fundo sem parar.

Estou sem luz

Deus fugiu e levou todos os anjos para longe de mim.

A escuridão toma cada vez mais conta do meu espírito

A morte acena sorrindo

Se aconchega e me abraça em seu colo frio, cheios de espinhos.

Eu agradeço sua visita,

E deixo ela me levar para longe de toda insanidade que acelera o mundo

Que aceleram nossos passos

Nos roubando tempo, saúde e vida.

Enfim, nos matando todos os dias.

A insanidade anda solta

Mas os loucos estão presos

A barbárie é praticada à luz do dia

Mas tudo por uma causa:

O dinheiro.

Aplaudimos de pé as mortes, as torturas, os estupros de crianças e mulheres

Amamos a desigualdade entre raças, o preconceito entre orientação sexual

Somos viciados em padrões, estigmas e jugos sem fundamentos

Somos fissurados na aniquilação do outro.

Abraçamos as injustiças feitas pela Justiça

Adoramos a diferença para nos envaidecer através de algum privilégio social.

Estamos à beira do colapso e do precipício,

Mas estamos sorrindo fazendo “selfie”

Bebendo e dirigindo.

A vida humana é só mais um número.

E números são números.

Não têm vida nem histórias, muito menos sentimentos.

A existência se tornou uma doença.

E adoecendo vamos nos drogando

Tornando-nos uns zumbis

E robôs programados para obedecer,

Mandar e executar a Ordem do Caos.

Então peço que me deixem sozinho

A minha morte é silenciosa

E nela, eu sobrevivo

É na vida que eu morro.

Eu estou seguro nos braços dela

Ela me dói, me joga ao chão

Me faz rastejar em meu desespero

Mas me abraça

O que a vida não faz.

Daqui uns anos eu ressuscito

E quando acordar deste sono profundo

Acredito que tudo já estará perdido e morto

Sem vida, sem esperança, sem o famoso ‘sentido’ que sempre buscamos.

Mas se eu encontrar ou me esbarrar com alguma vida humana

Eu irei vagar como um andarilho sem alma

Sombrio e sem destino neste fim que eu almejei.

Fechem as janelas!

Não quero que nenhuma luz invada minha alma em agonia e tortura

Quero morrer por amor a tudo que sonho e que busco incansavelmente sem temer

Enfrentando o ódio, a violência, o discurso bem feito para nos aniquilar

Enfrentando essa estrutura de poder que só nos faz escravos de um sistema cruel desde o nascimento até a aposentadoria injusta.

Muitos adoram me ver caindo, morrendo

Sentindo dor, me segurando em muros para não ser derrotado

Mas eu insisto enquanto puder e tiver forças.

Insisto em vencer minha dor.

Minha morte não pode me paralisar

Senão eu morro.

Então fechem as portas por favor!

Tranque-as e levem as chaves!

Deixe-me cair lentamente em meu abismo cheios de ideais humanitários

Deixe-me sofrer por aquilo que não pude escolher

Deixem-me pagar o preço por ser livre para rasgar as cortinas do Grande Teatro Opressor do Lobo.

E depois do luto,

Talvez eu encontre a minha vontade de viver outra vez

Talvez encontre alguma energia em mim ainda desconhecida ou alguma força oculta para enfrentar mais um dia cheio de sol escuro e de chuvas lindas.

A morte existencial é a pior

É o pior preço que se pode pagar em vida

E dela, já sou amiga

Contra ela, nada e ninguém pode.

Então, me deixem com ela

Ela está me ensinando a como viver melhor

A como sobreviver no eterno caos que é a vida

No eterno conflito que é viver para fazer o bem

Nesta Terra perdida cheio de seres perdidos

Desde que o homem inventou a propriedade privada

Até plantar a semente do capitalismo.

E assim eu vou vivendo

Sofrendo o que posso

Suportando o que devo e o que não consigo

Por heroísmo ou romantismo, eu já nem sei

Só sei que viver é coisa de teimoso.

E este sempre foi o meu defeito.