A Terra é uma laranja...
Há sessenta anos, a professora Francinete do Grupo Escolar de Pilar pendurou uma laranja num barbante e mostrou a fruta aos alunos, dizendo-nos que a Terra era daquele jeito. Logo imaginei que, no quintal da minha casa, havia terras e planetas; ainda me indaguei sobre uma terra tão verde como aquela laranja, muito mais do que a pisada por mim no caminho, entre a minha casa e o Engenho Corredor. Hoje, quanto mais se torna acinzentada, mais desejo que ela seja verde como a fruta de Dona Francinete. Mas, a cada dia, a natureza ganha cores da terra em Sonhos, de Akira Kurosawa, onde feições maltratadas nos nauseiam, de cor de cimento, com poças de lama fumegantes. Bem melhor seria nossa Terra verde como a laranja...
No Grupo Escolar não havia globo terrestre, só existia, na Diretoria, o Mapa do Brasil que descrevia um mundo triangular de matas e rios. Para explicar geografia maior, como a Terra, o recurso era a laranja; a confiança na professora nos convencia mais do que a analogia com aquela laranja comum, aos montes na feira. A comparação maior se resumia em demonstrar a redondeza do planeta, o que se contrapunha aos caminhos compridos, espichados entre as cidades vizinhas... Foi quando Arthur gritou que a Terra também parecia sua bola de borracha das peladas, na areia do Rio Paraíba. Dias depois, a professora levou para escola uma laranja amarela para ser o sol, em redor do qual circulavam a laranja verde e alguns limões sendo os astros que brilhavam, à noite, em forma de estrelas.
Aquele primarismo didático, hoje, contrapõe-se, de repente, aos meus olhos, quando a neta me mostra a foto do planeta, também redondo, semelhante à Terra, descoberto por um grupo de astrônomos do Centro de Harvard-Smithsonian de Astrofísica e que se chamará Kleper -10C. Não é uma pequena fruta, dezessete vezes a Terra, mega-terra que se encontra distante de nós 560 anos-luz, na constelação Draco. Também redonda como uma laranja, quase do tamanho de um enorme jerimum; seu sol a esquenta com tanta frequência que a torna quente, rochosa, sem vida, com alta temperatura. Há sessenta anos, já existiam tais planetas, mas não na escola de Pilar, caso contrário, a professora Francinete os teria enxergado, dito alguma coisa sobre eles, comparando-os com frutas maiores, redondas como a bola, quase como a Terra, achatada laranja...