Um Quarto

Outro dia acordei e descobri que tinha feito 25. Me olhei no espelho e ao invés de uma ruga, duas espinhas eclodiam no meu vértice nasal. Sinal dos tempos ou falta de namorada? Tanto faz. Fato é que eu completei meu primeiro quarto de século. Um mesmo quarto por toda a vida. Nenhum quarteto de cordas. Nem um quarto de esperança.

Certa vez me disseram que depois dos 25 anos já não poderíamos mais responsabilizar nossos pais por aquilo que somos, ou nos tornamos. E agora? No desamparo de mim mesmo. De quem é a culpa?

No fim das contas não há culpa nem culpados. Sair do útero é o primeiro processo traumático ao qual somos submetidos. Sem convite, sem permissão, sem “com licença” nem “hoje não”. Desamparados desde o princípio. Livres, se assim decidirmos.

No bolso esquerdo do casaco, uma folha de papel amassada, com a frase de Spinoza, que pela manhã eu anotara. Na mochila, o volume de “A Gaia Ciência”, que de aniversário eu ganhara. Na cabeça, uma frase e uma certeza — “Não há esperança sem medo, nem medo sem esperança.”

A incompreensão sobre um mundo onde drogas naturais são proibidas, enquanto toneladas de antidepressivos e ansiolíticos são receitados livremente nos consultórios. Para o lucro de quem vende. Para a falência de quem depende. Para a contenção da geração Y. Um lugar onde pessoas correm para assistir e aplaudir duas pessoas do mesmo sexo brigando como animais, mas viram o rosto e se sentem ultrajadas quando as mesmas se beijam. Onde pessoas de sexos opostos não podem ser amigos. Um lugar onde a gula é um pecado capital, exceto a gula pelo capital.

Um quarto de século de muito aprendizado e algumas conquistas. Desde muito cedo incumbido de mais responsabilidades do que podia suportar. Sempre suportando mais do que sabia poder. Desaprendendo a duvidar, sigo o caminho, hoje mais leve. Desacredito no fracasso em rejeição ao medo e a dor, pois sei que o medo é o que limita a vida e a dor é a certeza de estar vivo. Viver é confrontar. Conformar é morrer.