O QUE TE PRENDE?
Quando ainda era menina fiz minha primeira grande descoberta: era prisioneira do universo. Sem opções de fuga. Nenhum planeta habitável por perto. E se a Terra era pequena demais, a Via Láctea vazia demais e as outras galáxias distantes demais, para aonde ir? Estaria eternamente condenada a uma liberdade delimitada por um universo infinito, porém finito em suas possibilidades.
A sensação de aprisionamento me acompanhou por mais alguns anos até que ficamos íntimas. A intimidade dissimulou os muros e me acomodou à realidade.
Anos mais tarde fiz a segunda grande descoberta: a minha loucura não era, necessariamente, a loucura de todos. Porém, de vez em quando, fisgava alguém com umas verdades inventadas. Sempre que meu pensamento encontrava eco, eu ganhava um tantinho de liberdade e saía do estado letárgico a que a intimidade havia me abandonado.
O problema é que a segunda descoberta me remeteu às origens da primeira: a busca pela liberdade. Então passei a procurar, obsessivamente, por ecos e verdades. Vivia entre julgar as verdades alheias e compará-las às minhas – absolutas. Encontrei parceiros, fiz amigos; ganhei e perdi liberdade; desfiz amizades.
E, nessa busca inócua, aprisionei-me à angústia de ser. Não me preocupava mais com o universo. Adultos são obtusos: encarceram-se em si mesmos.
Uma vez um amigo me perguntou: “O que te prende?” Impossível responder. O nada abarca um sem fim de coisas “indizíveis”.
Minha terceira grande descoberta veio durante uma aula de espanhol: nem todo mundo sabe o que é angústia. A maioria das pessoas sequer ouviu falar a respeito e pensa que angústia é sinônimo de depressão.
Essa descoberta me chocou. Não consegui entender como o meu corriqueiro podia ser exclusivo. Impossível viver sem angústia – pensei. “Viver é dor e angústia”, não? Resolvi me poupar e decidi que vivia: essas pessoas apenas passeavam.
E assim continuei seguindo. Flexibilizei minhas verdades: preferi fazer amigos.
Todavia, um dia desses fiz mais uma grande descoberta: a busca pela verdade é a mãe da angústia. Mas que verdade? Jamais haverá. Felizes daqueles que – como um dia eu fiz – criam suas próprias verdades incontestáveis. Mais felizes ainda aqueles que nem pensam no assunto…
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