O Vazio Pesado
É noite.
E não consigo dormir.
Há um vazio aqui dentro
Gritando, sangrando, chorando
Rasgando-me o peito.
Esse vazio pesa muito
E se alastra
E me arrasta pelo chão
Expulsando-me a lucidez
Entorpecendo-me na escuridão.
Esse vazio é falta
Falta do que eu nunca tive
Falta do que eu não tenho
Falta do que eu desejo intensamente
E talvez, desesperadamente
Não recebo.
E também é muito medo.
Medo do que não posso conseguir
Medo que não posso ter
Medo que vem e mata-me os sonhos
Medo que vem para me derrotar e me vencer.
Vencer minha lucidez
Vencer minha esperança
Vencer minha força interior
Vencer o romantismo que eu cultivo nesta vida.
Esse vazio é um perigo
E sempre chega ao anoitecer
Vem me tirar o sono,
Vem me tirar o sossego
Queimando a minha paz
E fortalecendo meus medos.
Esse caos, esse barulho interno acordam minhas angústias
Então elas gritam (querem denunciar minhas mortes)
Esses tormentos em meus pensamentos abrem então minhas feridas
Até então adormecidas,
Esquecidas como dores perdidas.
Esse vazio me pesa a alma
Pesam-me os pensamentos
Pesa-me o espírito.
E para tudo isso,
Não há tratamento.
Não há cura,
Não há filosofia que te acalme
Nem literatura que exprime seu desespero.
É só você e seu infinito
Pode ser um infinito estrelado de sonhos e esperanças
Mas também pode ser um infinito repleto de sombras e fantasmas dos seus traumas de infância.
Então eu não durmo.
O dia então vem com o seu sol brilhando escuro dentro de mim
Como se quisesse me enganar, dizendo: está tudo bem assim.
Não! Não está!
A minha alma está no escuro! Não consegue enxergar?
E o sol então se vai, cabisbaixo e rejeitado pela minha escuridão
Vai lentamente derramando suas lágrimas ao chão.
É chuva!
E vem o temporal!
E minha dor só se curva diante das dores cinzas das nuvens que choram suas paixões frustradas, seus sonhos demolidos, seus amores levados pela morte e os não correspondidos.
É gota que cai em meu rosto e escorrega em minha face cansada
Cheia de rugas, cheia de histórias pesadas
São gotas que choram as tristezas do mundo
As tristezas das crianças mortas e abandonadas
Das mulheres humanamente traficadas e exploradas
São gotas de tristeza e desilusão dessas criaturas que mais constroem pontes de separação
Em vez de darem as mãos e abraçarem suas diferenças em união.
Tento me distrair com uma boa música,
Um filme, uma palestra,
Uma boa notícia!
Mas nada parece me preencher.
Então tenho que encarar isso e aprender que:
Viver é um fardo quando se ama os demais
E para qualquer luta humana, é imprescindível a nossa força diária:
A insistência.
Senão o vazio vem e nos leva
A escuridão vem e se aconchega
E se não lutarmos contras as nossas próprias fragilidades
Morreremos então de tristeza e depressão
Enterrados nessa melancolia nefasta e sombria
Engolidos pelos demônios do mundo
E se deixarmos tudo para sofrer,
Morreremos em nossos cantos escuros
De inação e solidão.
E não foi para isso que nós, humanos de fato, viemos ao mundo.
Viemos para uma missão: fortalecer a humanidade em nós.
Para que possamos viver um dia
Num mundo mais justo.
E quem sabe talvez,
Por sangue ou milagre, ou os dois juntos:
Com total desprezo a essa estrutura de poder que só nos tornam produtos e mercadorias
Nesse conjunto de nações que chamamos de mundo,
Que é nada mais é que uma economia universal de corpos que nascem para diariamente morrer
Em nome do Pai, que é o Capital
Em nome do Filho, que é a Produção
E em nome do Espírito Santo, que é o Poder.