Pequena Crônica Existencial

Ela queria muito; não consentia em ser pouco. Queria a glória do reconhecimento, apesar de preferir, muitas vezes, o anonimato.

Mas tudo tem um preço. O do holofote é a perda da privacidade. Que afirmativa banal. Mas depois de ter tudo, ela percebeu que não era e nem tinha nada.

Seu ser esfacelado não encontrava saída para a angústia provocada pelo sucesso. Desejava correr, desbravar o silêncio que outrora tinha perdido. Queria viver a solidão no sentido existencial de se encontrar a sós, consigo mesma.

Não lhe era permitido, afinal, foi a duras penas que a fama chegou; jogá-la fora não fazia parte dos planos dos que lhe circundavam.

Ela se sentiu um objeto. Usada, descartada, uma simples máquina de produção. Seu trabalho? Pouco importa. Na arte de fazer dinheiro, o sujeito é aniquilado. Subsiste seu corpo. Seus desejos? Pura ilusão. Não eram respeitados, simplesmente eram emoldurados para que o seu sorriso, mesmo sendo falso, fosse lucrativo.

E uma noite ela chorou sem que ninguém pudesse secar suas lágrimas. Sabia que na manhã seguinte tudo recomeçaria; mas de modo diferente: ela Pensou.

Enquanto lá fora a música ecoava, sua voz era silenciada pelas suas próprias escolhas. Era preciso lutar.

Como se pode consentir em não ser tudo? E ela queria mais. Queria voar alto em seus sonhos de puberdade. Queria encontrar a delicadeza do toque do amor. Queria alguém para chamar de "seu".

Mas a fama lhe tirou. Tirou sua identidade. Anestesiada por um momento de glória, ela se divertiu, até se sentir interiormente um lixo, no 14º andar daquele hotel.

Da janela avistava-se o rio Sena; as luzes da torre que quando criança ela sonhou escalar, lhe cegava os olhos. O cheiro de folhas de outono, molhadas pela chuva fina que caía, era como um remédio para a sua dor. A brisa fresca daquela noite parisiense lhe mitigava os sentidos.

De um lado, a porta, que levaria seus pés para a jornada da fama, enquanto, do outro, a janela lhe convidava a um voo dolorido, mas libertador.

A dúvida da escolha era a única dor que agora lhe tirava a paz. Um olhar para fora lhe permitiu um respirar profundo. Junto ao ar quente que saía dos seus pulmões, seus olhos se abriram para o momento decisivo. Seria agora ou nunca.

Foi assim que sua história recomeçou.

Girou-se em direção a porta. Destrancou-a e com passos firmes caminhou rumo às suas Próprias escolhas. Tinha descoberto que a vida só se vive uma vez.