Sem iate com hiato!

Talvez ele não imaginasse que uma tarde chuvosa fosse a sua sorte no amor! Havia certo tempo que José se separara de um lar até então feliz. O que aconteceu para que após uma década de casamento ele pra cá e ela para lá? Do fruto dessa união, abençoada por Deus até o dia da separação, uma filha, linda, bonita, bela, maravilhosa, dengosa, cheirosa, enfim tudo de melhor!

Mas chovia naquela tarde, e chovia muito. As ruas já alagadas no espelho da água refletiam as trovoadas, os relâmpagos e os trovões. Há diferença entre trovoada e trovões? Talvez haja, não sou profundo conhecedor das reações da natureza, por isto não sei. Porém sei que José e Maria (que nome simples e bonito, Maria!) se separaram em dia de tempestade. O sol nas avenidas e nas praças, e dentro daquela casa havia nuvens de ciúmes carregadas de gotas de desconfiança.

Faltaram dois ingredientes da construção do amor; a tolerância e a flexibilidade. Uma suporta o peso e outra o balanço. O vai e vem necessário para que um entre dentro do espírito do outro em um ritmo de bom convívio. Sem náuseas provocadas por um estagnado momento, onde a razão quer ser de um apenas. Paredes rígidas podem se rachar e até cair esfareladas. Os grandes edifícios têm um balanço em razão ao vento que os leva para um lado e o trazem para o outro. Assim deve ser a construção do amor.

E veio a noite, e chuva e relâmpagos continuavam até interromper a iluminação do poste, se não bastasse haver interrompido a luza da lua! Sob uma marquise que protegia dúzias de fugitivos, gente que fugia da chuva, benção de Deus aos sertanejos, lá estava José esperando a chuva passar, e quem sabe também esperando uma Verônica que lhe enxugasse o rosto molhando, de lágrimas de saudades!

Um vulto de mulher, de uma mulher solitária que também buscava um novo amor, já que o seu coração havia se esvaziado com uma separação. Entre o aperto dos frios fugitivos encontrou um corpo quente ao qual se encostou, e começaram os leves toques até que os carinhos entre as mãos aqueceram a esperança dos dois. Os dedos se ajustaram como se velhos amigos e as palmas aqueciam as imaginações.

Volta à luz e as nuvens carregadas se dissipam, olhos fechados um beijo de amor nascido sob uma tempestade. Abertos mostram então a realidade; novamente ali estavam José e Maria e Maria e José! Os velhos lençóis se tornaram novos, o bule de café saiu da prateleira dando cheiro do passado e da previsão de um feliz futuro. José e Maria nunca tiveram um iate para navegar no mar da vida. Mas tiveram um hiato para mostrar como é dolorido o mergulho nas profundezas da separação!

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Seu Pedro é o jornalista Pedro Diedrichs, editor do jornal Vanguarda de Guanambi, Bahia.