Como é o amor
Reflexão
Eu te amo!
É a frase mais sincera que existe e que faz a diferença, não importa a hora, não importa as dificuldades – ela sempre vence obstáculos.
O amor é uma atividade primordial na vida de todos os seres.
Não há quem não busque a felicidade na vida afetiva.
Mas quantos buscam aprender a amar?
E quantos caem desde a infância em padrões de conflito psicológico que envolve uma estranha satisfação e um prazer irracional no sofrimento próprio, ou no sofrimento alheio?
O pior sofrimento é o apego ao sofrimento.
Muitas vezes estamos tão apegados aos nossos problemas que não sabemos como nos desfazer deles. Lama Gangchen insiste ao nos dizer:
- "Coloquem seus problemas nas caixas e, um dia, vocês podem desfazer-se delas. Mas se vocês quiserem manter seus problemas com vocês, deixem-nos dentro das caixas! Deixem os problemas num espaço fora de vocês. Cada um tem que fazer sua experiência para entender o que estou falando. Se vocês ficarem com saudade de um problema, podem abrir a caixa e olhar para ele. Vocês logo vão sentir que não querem mais o problema, que não precisam mais dele. Na realidade, os problemas não fazem parte da natureza de nossa mente. A energia da mente deve ser sempre um espaço limpo e leve. Assim, poderemos reconhecer o espaço de nossa mente como algo muito precioso. Algo tão precioso que queremos preservar acima de tudo".
Sempre há tempo para a cura natural da alma, que resulta do despertar da compreensão e da sabedoria.
Há um pequeno texto do Padre Fábio de Melo que aprecio imensamente:
- “Você é quem decide o que vale a pena, e esquecer definitivamente aquilo que não vale a pena. Os jardineiros amam as flores e por isso cuidam de cada detalhe, porque sabem que não há amor fora da experiência do cuidado. A cada dia – o jardineiro perdoa as suas roseiras. Sabe identificar que a ausência de flores não significa a morte absoluta, mas o repouso do preparo. Precisamos aprender isso. Olhar para aquele que nos magoou, e descobrir que as rodeiras não dão flores fora do tempo, nem tampouco fora do cultivo. Se não há flores, talvez seja porque ainda não tenha chegado a hora de florir. Cada roseira tem seu estatuto, suas regras. Se não há flores, talvez, porque até então ninguém tenha dado a atenção necessária para o cultivo daquela roseira. A vida requer cuidado. Os amores também. Flores e espinhos são belezas que se dão juntas.
Não queira uma só. Elas não sabem viver sozinhas. Quem quiser levar a rosa para sua vida terá que saber que com ela vão inúmeros espinhos. Mas não se preocupe! “A beleza da rosa vale o incômodo dos espinhos”.
Quando duas pessoas se amam, elas não se submetem e não se dominam - Apenas se completam. O amor não é um simples sentimento, mas sim uma solução para um mundo melhor. Há caminhos que levam a ele, dependendo do jeito que os traçamos.
“O Amor é como uma Criança – deseja tudo o que vê” Shakespeare.
Há um complemento: A criança aprende com o passar do tempo: Nasce egoísta e com sensação de onipotência, mas, na medida em que cresce, percebe que nem tudo é como ela gostaria e, nem sempre suas necessidades e desejos são satisfeitos. Criança é mesmo sinônimo de amor puro e verdadeiro. Amor inocente e contente. Elas amam verdadeiramente e rapidamente perdoam sem cobrar nada em troca. Quando uma criança é repreendida pelos pais ou por outra pessoa, ela chora, fica brava, mais logo volta a agir naturalmente. Não fica com ódio e mantém a mesma amizade e carinho de filho. Até mesmo quando há brigas entre elas, o espírito de perdão sempre prevalece. No momento de um desacerto, uma bate e quebra o brinquedo da outra, chora. Mas, dali a pouco, tudo fica bem. Parece que não aconteceu nada. A verdade é que a criança sabe perdoar, e com ela precisamos aprender.
Chega um momento da vida que não dá mais enxergar os fatos somente pela ótica do "nosso pequeno mundo”. Amadurecer dói. Amadurecer significa ter de abandonar utopias e encarar a realidade como ela é -, muitas vezes mais fria e racional do que gostaríamos.
Infelizmente os homens têm menos maturidade emocional pela própria educação machista que recebem no Lar para ser dependentes da mulher. Tanto que um homem dificilmente consegue viver sozinho e ser auto-suficiente. Geralmente, é dependente da esposa, mãe, ou na falta delas, de uma empregada para cuidar dele.
O machismo é uma das piores chagas da civilização. Resulta da crença da “superioridade masculina” não apenas sobre a mulher, mas sobre todos os seres vivos neste planeta. A fim de garantir a hegemonia da sua dominação, machistas praticam diariamente todos os tipos de violência e apesar do repúdio aos seus atos arrogantes e a (ainda discreta) vigilância que a sociedade contemporânea já exerce sobre eles, continuam a se perpetuar através das novas gerações. Mas, aos poucos, esta situação está mudando e os pais têm percebido a necessidade de educar seus filhos para o mundo, para se tornarem auto-suficientes, para aprenderem a lidar com as frustrações e assumir a conseqüência de seus atos.
Amadurecer é aprender a depositar confiança nas pessoas, e ir ao encontro do outro menos desarmado já que a vida urge e não viemos ao mundo apenas para guerrear, precisamos também de doçura e de paz.
Segundo a filosofia do budismo tibetano, somos realmente felizes quando nos encontramos num estado energético, positivo, de permanente abertura e disponibilidade para apreciar e interagir com nós mesmos, com o ambiente e com as pessoas à nossa volta. Uma mente flexível é uma mente feliz. Flexibilidade é uma capacidade que só adquirimos quando percebemos tanto as nossas necessidades quanto as dos outros.
Trocar idéias é um sinal de felicidade, pois indica que já não estamos mais atados em nós mesmos e ao mesmo tempo, já não nos perdemos nos desejos dos outros...
Quando aprendemos a simplificar as coisas e ver seu verdadeiro valor, a vida se torna mais prazerosa, mais gostosa de ser vivida
O texto a seguir é reproduzido da obra “A Arte de Amar”, de Erich Fromm, que foi publicada, com tradução de Milton Amado, pela Ed. Itatiaia, de Belo Horizonte, em 1990.
A Arte de Amar
Erich Fromm
No Verdadeiro Afeto, A União É Total Mas Preserva a Autonomia.
O desejo de fusão interpessoal é o mais poderoso anseio do homem. É a paixão mais fundamental, é a força que conserva juntos a raça humana, clã, a família, a sociedade.
O fracasso em realizá-la significa loucura ou destruição - auto-destruição ou destruição de outros.
Sem amor, a humanidade não poderia existir um só dia. Contudo, se chamarmos “amor” a realização da união interpessoal, poderemos encontrar-nos em séria dificuldade. A fusão pode ser obtida de diversos modos - e as diferenças não são menos significativas do que aquilo que é comum às várias formas de amor. Devem ser todas chamadas de amor? Ou devemos reservar a palavra “amor” somente para um tipo específico de união, aquele que tem sido a virtude ideal para todas as grandes religiões humanísticas e sistemas filosóficos dos últimos quatro mil anos de história ocidental e oriental.
Como se dá com todas as dificuldades semânticas, a resposta só pode ser arbitrária.
O que importa é sabermos de que espécie de união estamos falando, quando falamos de amor. Referimo-nos ao amor como à resposta amadurecida ao problema da existência, ou falamos das formas imaturas do amor que podem ser chamadas união simbiótica? Nas páginas seguintes, darei o nome de amor apenas à primeira. Começarei a discussão sobre o “amor” com a última.
A união simbiótica tem seu modelo biológico na relação entre a mãe grávida e o feto.
São dois e, contudo, um. Vivem “juntos” (sym-bio-sis), necessitam um do outro. O feto é parte da mãe, recebe dela tudo de que necessita; a mãe é seu mundo, em suma: alimenta-o, protege-o, mas também a própria vida dela é acrescida por ele. Na união simbiótica psíquica, os dois corpos são independentes, mas a mesma espécie de ligação existe psicologicamente.
A forma passiva da união simbiótica é a da submissão, ou, se usarmos um termo clínico, a domasoquismo. A pessoa masoquista foge ao insuportável sentimento de isolamento e separação tornando-se parte e porção de outra pessoa, que a dirige, guia, protege; que, em suma, é sua vida e seu oxigênio. O poder daquele a quem alguém se submete é expandido, trate-se de uma pessoa ou de um deus; é tudo, e o submisso nada, exceto naquilo em que é parte dele. Como parte, é parcela da grandeza, da força, da certeza. A pessoa masoquista não tem de tomar decisões, não precisa assumir quaisquer riscos; nunca está só - mas não é independente; não tem integridade; ainda não nasceu de todo. Num contexto religioso , o objeto da adoração é chamado ídolo; num contexto secular de relações de amor masoquista, o mecanismo essencial, o da idolatria, é o mesmo. A relação masoquista pode-se misturar com o desejo físico, sexual; neste caso, não é só uma submissão de que participe o espírito de alguém, mas também todo o corpo. Pode haver submissão masoquista ao destino, à enfermidade, à música rítmica, ao estado orgíaco produzido por drogas ou sob transe hipnótico: em todos esses exemplos a pessoa renuncia à sua integridade, torna-se o instrumento de alguém ou de algo fora dela própria; não precisa resolver o problema de viver por meio da atividade produtiva.
A forma ativa da fusão simbiótica é a dominação, ou, para empregar o termo psicológico corresponde ao masoquismo, o sadismo. A pessoa sadista quer escapar de sua solidão e de sua sensação de encarceramento, fazendo de outra pessoa uma parte, uma parcela de si mesma. Expande-se e valoriza-se incorporando outra pessoa, que a adora.
A pessoa sádica depende tanto da pessoa submissa quanto esta daquela; uma não pode viver sem a outra. A diferença só está em que a pessoa sádica ordena, explora, fere, humilha, e a masoquista é mandada, explorada, ferida, humilhada.
Tal diferença é considerável num sentido realista; num sentido emocional mais profundo, a diferença não é tão grande quanto o que ambas têm em comum: fusão sem integridade. Se compreende isto, também não é surpreendente verificar que normalmente uma pessoa reage tanto da maneira sádica como da masoquista, de modo geral para com objetos diversos. Hitler reagia primordialmente de maneira sádica para com o povo, mas masoquistamente para com o destino, a história, o “poder mais alto” da natureza. Seu fim - o suicídio em meio à destruição geral - é tão característico quanto o foi seu sonho de sucesso, de dominação total. (Fears of Escape from Freedom, E. Fromm, Londres, Routledge, 1942).
Em contraste com a união simbiótica, o amor amadurecido é união sob a condição de preservar a integridade própria, a própria individualidade.
O amor é uma força ativa no homem; uma força que irrompe pelas paredes que separam o homem de seus semelhantes, que o une aos outros; o amor leva-o a superar o sentimento de isolamento e de separação, permitindo-lhe, porém, ser ele mesmo, reter sua integridade. No amor, ocorre o paradoxo de que dois seres sejam um e, contudo, permaneçam dois.
Ao dizermos que o amor é uma atividade, enfrentamos uma dificuldade que reside na significação ambígua desta palavra.
Por “atividade”, no emprego moderno do termo, queremos normalmente referir-nos a uma ação que produz mudança numa situação existente, por meio de gasto de energia. Assim, um homem é considerado ativo quando faz negócios, estuda medicina, trabalha numa usina, fabrica uma mesa ou dedica a esportes. Todas essas atividades têm sido em comum: dirigem-se para um alvo exterior a ser alcançado. O que não se leva em conta é a motivação da atividade.
Veja-se, por exemplo, um homem impelido a incessante trabalho por um sentimento de profunda insegurança e solidão; ou outro impulsionado pela ambição, ou pela avidez por dinheiro.
Em todos esses casos a pessoa é escrava de uma paixão, e sua atividade é de fato uma “passividade”, porque ela é impelida; é o paciente, não o “ator”. De outro lado, alguém que se assente calmo e contemplativo, sem outro alvo que não o de experimentar-se e à sua unidade com o mundo, é considerado como “passivo”, porque não está “fazendo” coisa alguma. E, na verdade, esta atitude de meditação concentrada é a mais alta atividade que existe, uma atividade da alma, só possível sob condições de independência e liberdade interiores. Um conceito de atividade, o moderno, refere-se ao uso de energia para consecução de metas externas; o outro conceito de atividade refere-se ao uso dos poderes inerentes ao homem, sem que importe a produção de qualquer mudança exterior.
Este último conceito de atividade foi formulado com muita clareza por Spinoza.
Diferencia ele os afetos entre ativos e passivos, “ações” e “paixões”. No exercício de um afeto ativo, o homem é livre, é o senhor de seu afeto; no exercício de um afeto passivo, o homem é impelido, é objeto de motivações de que ele próprio não tem consciência.
Assim Spinoza chega à afirmação de que virtude e poder são uma só e a mesma coisa (Spinoza, Ética, IV, Def. 8).
A inveja, o ciúme, a ambição, qualquer espécie de cobiça são paixões; o amor é uma ação, a prática de um poder humano, que só pode ser exercido na liberdade e nunca como resultado de uma compulsão.
O amor é uma atividade, e não um afeto passivo; é um “erguimento” e não uma “queda”.