Voa, canarinho!
Voa, canarinho!
Deixei o meu coração na chuteira em 1982 e por lá também ficou a Poesia do futebol. O meu canarinho está preso na gaiola das lembranças e o grito de gol emudeceu naquele ano e, até hoje, não saiu da garganta.
A camisa amarela está amarelecida e o passado ainda pergunta para mim, por quê? Por que arte deve fazer sofrer? Arte é arte e não se responde!
Naquele ano (1982), esse torcedor retirou a camisa da seleção, desamarrou a chuteira e correu para a arquibancada do silêncio. Daí em diante, errei todos os "passes" em direção a alegria; fiz "faltas" contra a partida da vida e, impedido, recebi o cartão vermelho de torcedor.
A minha bola furou em 1982!
Hoje, chuto de canela para, pelo menos, não perder o futebol que outrora me arrancou lágrimas. As lagrimas e suores de torcedor e jogadores, de ontem, encharcaram o gramado e a bola deslizava na grama escrevendo Poesias pelos estádios.
Voa, canarinho, voa!
O sonho voou nas asas do canarinho e outro sonho nunca mais me fez sonhar. O luto ainda vigora para aqueles que viram os dribles desconcertantes da arte, as jogadas de efeito da beleza, os gols de placa de um futebol com chuteiras e coração.
Perdi a partida para o azul mais triste pintado!
Perdi para lances despretensiosos!
Cada qual tem o futebol que merece; eu mereço o de 1982!
Não ergui a "taça", mas tenho o troféu que me é de direito e que ganhei na derrota; saudade da chuteira com o coração amarrando seu cadarço.
Saudosismo? Complexo de vira-lata? Não!
Não me interessa erguer o troféu da vitória fazendo conluio com o esdrúxulo; rabiscando a arte; apagando a poesia. Que a seleção traga o "caneco de ouro", brinde a improbidade e erga a corrupção treinada nos campos do conchavo; que o povo adormeça novamente e a pátria cochile com a vitória; que os "heróis" desfilem nos carros e trios elétricos e os aplausos ecoem na politicagem e legitimem o circo oferecido; que a cerveja esteja gelada e o tira-gosto seja servido à gosto pelo ufanismo temporário.
Eu fui campeão em 1982!
Cada qual tem o campeão que merece!
Minha seleção não jogou futebol; brincou de arte. A arte não precisa de troféu, primeiro lugar, pódio; a arte apenas brinca de emoção no coração de quem sabe entendê-la.
Soltei da gaiola das lembranças o canarinho! Voa, canarinho, voa, mostra pra esse povo o que já sei!
Mário Paternostro