MINHA PARTE QUERO EM LEITE.

Minha família é apaixonada por leite. Herança do nosso patriarca Antonio Romeira. Alguns o chamam de Tonico, de Tico e de muitos outros apelidos, mas para mim sempre será o meu Veião. Ele é daqueles que quando ia ao curral tirar leite das vacas, embaixo do braço levava uma garrafa de café e na mão um

canecão com capacidade de pouco mais de 700 ml. Não me lembro de ele ter se esquecido de um desses itens.

Metade do caneco era enchida com café e a outra completava com leite tirado na hora, ou melhor, da teta para o canecão. A prática fazia com que o leite caísse com força na vasilha e imediatamente subisse uma espuma bonita de cor meio dourada. Minha boca enchia d'água. Mas como nunca fui amante de café, a espuma que fazia em meu copo era amarronzada, resultado do leite com chocolate. Meu velho virava um daquele goela abaixo logo na primeira vaca, a Marieta e, outro na última: a Mochinha, que tinha os bicos dos peitos tão grandes, que se pareciam com aquele velho coador de café, que certamente sua avó ainda usa.

Gostamos também dos derivados do leite. Minha mãe, por exemplo, qualquer comida que faz, ainda hoje, tem lá uma rodela de queijo para misturar: a quentura do alimento feito na hora derrete-o formando aquelas ligas deliciosas. Mas tivermos de sair da roça para a cidade. De aí em diante sobreveio uma pindaíba danada e acabou a fartura de leite. Que saudade da Mochinha! A situação apertou tanto que dificilmente meu pai me levava ao mercado: eu encafifava na seção dos iogurtes e não saía nem com reza braba. De vez em nunca ele aparecia em casa com aqueles danoninhos vermelhinhos. Aff! Era um pega pra capá. Eu sentia o cheiro de longe. Talvez fossem as lombrigas.

Certo dia apareceu em casa um representante de uma empresa chamada Sulmineira, que negociava derivados de leite para as pessoas revenderem. Meu pai, homem visionário, já foi falando: "em casa não vai funcionar. Pode levar os produtos embora." Minha mãe, mal intencionada, disse: "funciona sim." Evidentemente que a palavra dela prevaleceu. Mas o velho estava certo: meu zoio quase caiu da cara quando enxergou o litrão de iogurte de coco, suadinho. O prejuízo foi tamanho que quase tivemos de lavar o carro do representante para pagar o que consumimos. Tudo.

Regressei à infância quando fui à praia com meus sobrinhos e, na hora de pedir uma bebida, o filho mais novo de meu irmão, que sempre aparece em alguns vídeos comigo, disse:

- Quero um suco de morango

- Com água ou leite?

- Leite, é claro. De preferência sem os morangos.

A herança de meu velho vai, paulatinamente, passando de geração em geração.

Eder Tofanelli
Enviado por Eder Tofanelli em 13/05/2014
Reeditado em 30/07/2014
Código do texto: T4804828
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