DAS COISAS QUE (AINDA) NÃO FIZ
“Contei meus anos e descobri que terei
menos tempo para viver do que já
tive até agora.... Tenho muito mais
passado do que futuro...
(Ricardo Gondim)
menos tempo para viver do que já
tive até agora.... Tenho muito mais
passado do que futuro...
(Ricardo Gondim)
Fazendo um balanço de minha vida (coisas de quem já viveu meio século) percebi que tenho uma listinha de coisas que ainda não fiz. Por exemplo: ainda não concluí o curso de Direito, provavelmente não irei concluir – por escolha; não fiz o curso de alemão, portanto ainda não li Hegel em sua língua original; não fiz a tão sonhada viagem a Grécia, embora conheça suas ruas, mares e seu ar como um nativo (é que sonhei tanto com essa viagem, li horrores sobre tudo que diz respeito à Grécia que me sinto parte dela); não dei um abraço em Pedro Bial (esse desejo é anterior ao BB, mas agora quem não quer sou eu).
Também não fiz a biblioteca de meus sonhos, um espaço amplo, arejado, com cheiro e cara de leitura, continua no alto de minha lista de desejos; não namorei em Veneza, nem visitei o Vaticano. Não tomei café em Paris, mas tenho tomado bastante café regado a poesia aqui mesmo em Mossoró; não joguei fora algumas fotos horríveis, ao contrário, elas só aumentam; não assisti a um show de Chico Buarque de Holanda, nem de Emílio Santiago, este infelizmente foi antes de mim, quem sabe em outra dimensão ele faça um show só para mim? Zico se aposentou e eu não fui vê-lo jogar. Não segurei a mão do Papa, embora tenha ficado muito próxima dele; não fui assistir Titanic no cinema e quando assisti em casa não gostei. Não li Paulo Coelho, nem pretendo fazê-lo. Também não li livros de autoajuda, confesso que tentei, mas... Não deu.
Finalmente li Pollyana Menina! Não fiquei chocada com os livros de Adelaide Carraro (li todos, escondida, é claro), não recomendo, mas a curiosidade era enorme. Não fiz primeira comunhão. Não brinquei de bambolê, nem andei de patins. Ainda não acertei na mega-sena, continuo tentando. Não comecei a fazer caminhada, nem hidroginástica.
Das coisas que não fiz por opção não sinto falta, as que deixei de fazer por preguiça (o pecado mais difícil de abolir de minha lista) ou comodismo não sei se ainda terei tempo para corrigir, outras ainda quero poder fazer, mas descobri que fiz mais do que sonhei e, embora algumas coisas sonhadas ainda não tenham sido realizadas, já realizei muitas com as quais nunca havia sonhado, e isso tem um sabor especial. Muito do que sou, ou tudo, é resultado, também, dessas ausências. A mulher que amadurece, ainda tem muito daquela menina interiorana, cheia de alegria e sede de aprender, da adolescente que sonhava em mudar o mundo, que acreditava na justiça, no ser humano, na vida.
Hoje a mulher já consegue saber até onde seus sonhos podem ir, já conhece (?) os limites de seus desejos, já conheceu a face negra da vida, conviveu com a dor da perda e da traição, mas continua acreditando nas pessoas, amando, dando o melhor de si e tentando melhorar, pois sabe de seus defeitos (mais do que gostaria), suas manias, suas limitações, mas essa mulher se recusa a desistir de lutar por tudo que acredita e continua tendo sede de saber e de justiça.
A idade que avança com certa celeridade mostra que o tempo passa. Indiferente ao que e como fazemos, ele sempre passa. Hoje eu sei que muito já caminhei e que, daqui por diante, terei menos caminhos pelo frente. O passado vai ficando cada vez maior. O tempo vivido ultrapassa, em muito ou pouco, o que ainda tenho para viver. Olhando pelo retrovisor vejo que há uma longa estrada percorrida. Atalhos perdidos. Estradas desviadas. Caminhos onde, muitas vezes, tive que seguir por força da caminhada.
Independente de tudo que passei reconheço que tenho muito a agradecer ao Senhor da vida e do tempo por tudo que conquistei. Não construí uma herança material para meus descendentes, mas acredito que sempre vivi procurando fazer o melhor.
Creio que posso afirmar com segurança: o que não fiz, também, me ajudou a ser o que sou. Foi útil.
Texto Reeditado a partir deste http://www.recantodasletras.com.br/cronicas/927853