SUSCETÍVEL
          

          Você já desejou tomar banho de chuva e tudo que tinha no céu era a limpidez do ar? Nem uma nuvenzinha se quer! Já desejou ser cantor quando realmente não passava de um mudo, sem fala, sem som, literalmente? Nem um gemidozinho se quer pra expessar a dor ou prazer! Já desejou tomar um gostoso café quentinho e saboroso, mas a garrafa quebrada e vazia mais parecia um bule furado? Nem o cheirinho do aroma sentir! Já desejou matar a fome que assola os olhos e o estômago com um prato vazio de nada? Nem um farelinho de nada, nadinha! Já tentou escrever um poema que não existe? Nem um rabisco torto em linhas perfeitas! Pois é, este sou eu...

               Sem eira nem beira, sem ter onde estar, ficar ou pra onde ir nesse mundo de letras embararalhadas em des em cantos! Talvez ele não exista mais dentro de mim, talvez ele nunca tenha existido mesmo, apenas um faz de conta que não conta nada pra ninguém nem ninguém faz conta! Algo feito assim um caminho perdido, melhor nunca tentar percorrê-lo, tomar um atalho talvez seja mais seguro. Sou mar, morto, no próprio sal com gosto de lágrimas...


          Talvez eu queira perder-me de mim mesmo, não mais me encontrar, deixar no sonho a oportunidade de viver! Que mal tem isso, se isso é apenas poeira num tempo que já não existe! Estou feito o universo em expansão constante e contínua, resfriando cada vez mais...indo às fronteiras do desconhecido e escuro manto gelado, afastando-se. Texto sem nexo, UTI sem energia, blackout noite e dia na sombria inexatidão. Sabe aquele livro que desejamos ardentemente ler e folhear...encontrei! Sabe o que descobri? Que meu livro está com as páginas em branco e que reescrevê-lo é  minha missão vital, lembrar de tudo que já fiz e vivi, falar daquilo que não mais terei.

 
Ricardo Mascarenhas
Enviado por Ricardo Mascarenhas em 05/05/2014
Reeditado em 04/07/2021
Código do texto: T4795402
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