Ela, Sempre Ela

Ultimamente ando um tanto distante das escritas, pois minha atenção está voltada para tijolos, pedras, cimentos, e outros petrechos desta ordem de construção sobre a reforma da minha casa. Este tipo de evento consome grande parte da nossa atenção e dinheiro também. Nestas condições, além de cuidar da minha mãe e trabalhar, de fato a vida fica mais segmentada para as praticidades e resoluções concretas do que para o lirismo que as letras nos trazem. Mas aqui estou inspirada pela bela homilia proferida ontem, 27 de abril, pelo nosso querido e reverendíssimo Dom Francisco José Zugliane, bispo emérito da nossa Diocese. Neste dia, numa missa comemorativa, com a participação do Coral da Catedral, foram celebrados seus 80 anos de vida. Bela Cerimônia.

O que me chamou a atenção na homilia de Dom Francisco, foi sobre os laços familiares de amor e respeito dele para com os pais e em especial a mãe. Contou que durante os 14 nos de formação para a vida eclesial a mãe sempre lhe fazia a mesma colocação: “Filho você tem certeza de que quer ser padre? Olha lá! Não vá envergonhar a nossa Igreja”. Isto sempre que vinha para as férias e ainda no dia da ordenação ministerial a mãe chegou e proferiu a mesma máxima. Insistente essa mãe não foi? E hoje onde anda essa mãe insistente, perspicaz às escolhas dos filhos, atenta as condutas. Onde? Anda atarefada, se não assoberbada, de atividades que consomem grande parte do seu dia e do tempo. Realiza as coisas práticas e das suas responsabilidades e delega para terceiras outras tarefas mais.

Quem me acompanha nesta coluna, sabe o quanto sou atenta a trazer assuntos relacionados à família, aos vínculos que estabelecem e reflitam ao bom desempenho sobre nosso viver: das escolhas para aceitar as perdas e os ganhos, sem lamentar o que possa vir a dar errado. Seguir na certeza de que é o melhor que se pode fazer no momento. No caso de Dom Francisco a máxima da mãe foi fortalecendo a escolha daquele tempo. Contou que foi para o Seminário menor aos 14 anos. Convenhamos que fosse muito jovem para ter certeza da escolha que fazia, mas aí a presença fundamental da mãe todo o tempo que ajudava a sedimentar o futuro de um jovem padre e para nossa alegria de um bispo. Ele foi o primeiro bispo da Diocese de Amparo, só deixou a cátedra quando completados os 75 anos de idade, data limite para uma merecida aposentadoria, e nós sabemos que ele continua ativo como padre e ser humano inteligente, amigo que é.

As escolhas sempre nos remetem às perdas e aos ganhos, algumas mais as perdas do que ganhos. E notamos que a mulher diante da realidade consumista, imediatista, efêmera, tem se deixado levar às vezes, ou quase sempre, por estes caminhos atuais. O tempo da partilha, da convivência conjugal e da família fica prejudicado. O dinheiro e tudo que pode comprar e pagar vem em primeiro lugar. Já escutei de mães com filhos adolescentes na terapia dizer-me que faz tudo pelo futuro do filho, para que amanhã possa ter as coisas. Certa ocasião eu disse a uma mãe convicta no que fazia que almejasse por ela que o filho ainda estivesse ao seu lado para usufruir dos resultados de todo esse sacrifício. Tenho noção que fui dura com aquela mãe, mas não me deixava outra opção, pois estava obcecada com a certeza que sair de casa de segunda a segunda para trabalhar numa empresa que exigia dela atenção exclusiva e o que menos importava era o contexto familiar dela, era o certo no momento.

Por que Ela, Sempre Ela? Porque é o ser da base sobre nossa existência. Existimos desde o momento em que uma mulher concede a gravidez para depois conceber e deixar nascer o fruto do seu carinho. A missão da maternidade é árdua e não se faz da noite para o dia, leva uma vida inteira até que a morte os separa. A mulher só será mãe quando seu bebe a reconhecer como tal, antes disto ela é a cuidadora. Uma cuidadora que transmite parte do seu ser ao bebe. Uma posição diferenciada das outras pessoas que cuidam da criança quando ela, mãe, está ausente. Desta estreita relação os vínculos vão se formando. Então digam como ficam os casos dos bebes em tenra idade sendo delegado aos cuidados de terceiros? Pode ser que olhando por este prisma chegamos aos casos onde mãe e filhos ou vice-versa não conseguem lidar com presença de ambos, não reconhecem a autoridade da mãe, dos pais, não estabelecem os conceitos de intimidade e proximidade. Nestes casos os ruídos externos interferem no silêncio que toda conjugalidade requer, e deste modo possamos reconhecer e olhar para o outro como ele é e não como esperamos que ele viesse a ser; Figuras decorativas que existem apenas para suprir as necessidades da própria existência, ou seja, o fortalecimento das relações narcísicas e não das relações altruístas que tanto almejamos encontrar nos dias atuais. Ainda bem que encontramos mulheres em cuja maternidade é tida como uma veia arterial tão importante para a sobrevivência entre elas e seu filho.

Graça Costa

Abril/2014