SONHEI, JURO QUE SONHEI ! . . . (06)
Na noite de antes de ontem, sonhei salvando uma vida. Com profundas e enormes cicatrizes em meu rosto e no peito, eu salvara alguém das afiadas garras de um bando de animais ferozes. Acordei deveras cansado e suado, sem ter ideia exatamente das imagens sonhadas, mas tinha certeza de que salvara uma criatura humana.
Dia seguinte, ainda pela manhã, viajei a Recife. Lá, tomei um ônibus urbano (linha Caxangá/Boa Vista) em direção ao centro. Posicionei-me junto à catraca – parte dianteira do ônibus – catando moedas no bolso para pagar a passagem. À minha frente uma jovem senhora, grávida.
De repente (como todos os “de repente”), o inesperado:
Alguém comete uma “barbeiragem” à frente e na mesma faixa do ônibus que nos conduzia. Velocidade não superior a cinquenta quilômetros por hora. O motorista, a fim de evitar uma indesejada colisão, acionou bruscamente o freio de emergência.
Um quase impacto. Grande rebuliço entre os passageiros. Acho que fomos nós – eu e aquela senhora grávida – os mais seriamente atingidos, porque estávamos soltos, em pé e de costas para a inopinada ocorrência.
Por isso, desavisado e desprotegido, fui arremessado de volta aos três degraus de acesso da porta dianteira. Ainda não entendi o porquê, mas meu corpo se alojou na posição fetal. Precisei de ajuda pra me levantar. Pior: um corte no supercílio encheu meus olhos de sangue, tanto que também me impediu de ver outras consequências da inevitável queda.
Lenço insuficiente. Uma pequena toalha retirada de minha bolsa ajudou a enxugar o sangue. “Arre! Meu sonho se inverteu!” – pensei.
A senhorinha grávida foi, igualmente, catapultada. Segundo ela e os passageiros que testemunharam, a freiada a atirou para o mesmo local onde eu estava caído. Meu corpo dobrado, embora magro, lhe serviu de colchão e suavizou sua queda (sinceramente, não senti o seu peso). Uma queda que, noutras circunstâncias, poderia ter sido fatal para o seu bebê. "Viva! Salvamo-lo!"
Ela agradeceu muito a Deus por eu estar ali. Embora machucado e ainda tentando estancar o sangue do supercílio, eu também agradeci. Meu coincidente sonho (mais pesadelo) da noite anterior estava confirmado, porém sem me deixar tão seriamente mutilado.
Com o leve acidente, que agora considero inseparável do meu sonho, aprendi a aceitar e conviver muito bem com a diminuta cicatriz facial adquirida.
"Gracias a la vida".