LUCIANO DO VALLE - A VOZ que calou fundo.
Luciano do Valle - A Voz que calou fundo.
Jorge Linhaça
19 de abril de 2014 e o “Bolacha” seguia para Uberlândia para narrar mais um jogo de futebol.
Não chegou ao estádio, um mal súbito privou-nos de sua voz marcante e da sua emoção contagiante.
Luciano do Valle não era apenas um narrador esportivo, como todo bom canceriano (nasceu em 4 de julho) colocava toda a sua emoção em tudo o que fazia, sem a emoção Luciano não seria Luciano. Aquele rapazote que iniciou nos microfones com 16 anos de idade talvez nunca tenha sentido a real dimensão que sua carreira alcançou. Extrapolou os campos de futebol, foi a voz da ascensão do Vôlei ( Luciano do Vôlei), foi a voz que levou o Brasil a redescobrir o basquete, o boxe, a sinuca, o automobilismo e muito mais. Foi a Voz que ajudou a resgatar a autoestima de um povo que não percebia que nem apenas de futebol vive o esporte.
Foi ele quem comprou a briga para permitir que ex-atletas ocupassem as cadeiras de comentaristas em mesas redondas e durante as transmissões esportivas. Luciano via o que poucos viam, ele via o futuro e o futuro era hoje.
Não podia haver morte melhor para Luciano do Valle, do que o tipo de morte que o levou, uma morte breve a caminho de fazer o que mais amava fazer. Infelizmente, como disse o Neto, Luciano foi numa hora inconveniente, às portas da Copa do Mundo em seu país, uma oportunidade única na vida de um jornalista, de um locutor, de um jogador...Talvez a única oportunidade na vida de muitos de acompanhar um evento desse porte em sua própria terra.
Luciano era realista em relação à Copa, que ela servirá para varrer para debaixo do tapete uma série de problemas e na verdade trará outros. Afinal das contas, toda a infraestrutura prometida, afora os estádios, não saiu do papel. As promessas vazias e o superfaturamento “comem solto” por toda a parte. Mas deixemos isso para outra ocasião. Hoje vamos lembrar Luciano do Valle, que sempre valeu mais do que seu peso em ouro. Que o digam os que conviveram com ele e receberam seu apoio e sua generosidade.
Luciano do Valle não pode ser comparado a nenhum outro locutor esportivo, assim como Pelé não pode ser comparado a nenhum outro jogador de futebol. Luciano tinha aquela luz própria que ou eleva a pessoa aos louros do reconhecimento ou enterra as pessoas no ostracismo.
Para nossa sorte, Luciano galgou os degraus da fama e nos brindou com sua emoção real e contagiante, com sua busca incessante por um aperfeiçoamento profissional e com a sua necessidade de enfrentar e vencer desafios que para muitos pareciam apenas loucura.
O legado do “Bolacha” vai muito além das quatro linhas ou do esporte, vai muito além do jornalismo, o seu legado pode ser visto em cada menino ou menina que se dedica a qualquer esporte por este país afora. Pode ser visto no olhar doído de cada um de seus companheiros ao longo dos seus cinquenta anos de carreira.
Cresci ouvindo Luciano e outros locutores, mas Luciano era diferenciado, tinha aquele algo mais, aquela emoção e sensibilidade que existem em poucos, e isso, aliado à sua técnica perfeita, o tornaram uma referência a ser perseguida por aqueles que pretendem sucesso semelhante.
Mas, A VOZ, se calou e sua falta calou fundo dentro de todos nós.
A Copa será mais triste sem a voz de Luciano, mas, quem sabe se isso não faz parte de um plano maior lá no céu.
Mas Luciano ainda teve um privilégio diferente, como bom caipira, sua última transmissão não poderia ter sido mais simbólica. Narrou a vitória do Ituano sobre o Santos, a vitória de um time modesto do interior que deixou pelo caminho todos os grandes do estado.
Luciano deixou este mundo na mesma data de Dener, um gênio da bola morto precocemente.
Ah, se um era um gênio com a bola nos pés, o outro descrevia como ninguém, em tintas carregadas pela emoção, as jogadas de tantos outros gênios. E se é verdade que é preciso um gênio para compreender e descrever outro gênio, Luciano era um gênio da emoção, das palavras, da redescoberta do esporte.
Do Valle, é um daqueles divisores de águas, existe a transmissão esportiva antes e depois de Luciano.
De resto me sobra a saudade desde já!