João e Maria

Confiar é imprescindível aos bons relacionamentos. Há quem diga que devemos desconfiar sempre; que não se deve confiar em ninguém, pois podemos nos machucar. Eu, ao contrário, prefiro confiar.

Confesso que já fui mais crédula. Acreditei em quem não devia e quebrei a cara mais de uma vez.

É uma sensação terrível quando nos descobrirmos traídos.Nos sentimos perdidos e vivemos uma dor solitária. Andei, a partir de então, com um pé atrás, como se diz.Passei a desconfiar de tudo e de todos. Lendo nas entrelinhas das frases e das expressões faciais; atenta às modulações das vozes.

Por uns tempos, não confiei em ninguém. Todos me trairiam, porque acreditar? Preferia me relacionar na superfície. Para que me aprofundar em terreno desconhecido se poderia ser pega em armadilha a qualquer momento?

Não avançar era mais seguro.E não avancei por um longo período.Ensaiava e nunca encenava o espetáculo.Esboçava a tela e não terminava o quadro. Não me entregava e também não vivia plenamente.

De repente fui convidada a acreditar. Um convite irresistível para viver o amor.Mas não cedi fácil. Argumentei, disfarcei, expus meus motivos, resisti.

Do outro lado havia persuasão e acolhimento.Tudo seria possível. As chagas fechadas. As dores sanadas.Uma vida a ser vivida por inteiro. Do jeitinho que no meu íntimo eu sonhava ter.

Fui cedendo e gostando.Fui me dando em corpo e alma.Acreditei e me senti muito bem. Chegara o momento de confiar de novo e dizer o que se passava de verdade em mim.Ser eu mesma, sem medo.Ir lá fundo e dividir meus sonhos.Abrir o coração para entrada de outro.Oferecer de mim o melhor e o pior, sem receio.

O mundo é infinitamente mais bonito assim.Ainda que haja pedras nesse caminho é suave percorrê-lo. Pois, se eu cair, há quem me ajude a levantar. Se eu chorar, alguém secará as lágrimas. Se o medo vier, terei outra mão a me dar coragem.

Sei que não tenho as rédeas de outras vidas. Sei que não somos donos da estória, mas quero crer em nós.Crer que faremos o possível pelo outro. Crer que seremos leais, sempre. Crer que teremos prioridade na vida do outro.

A estrada é tortuosa e precisamos de toda segurança para seguir. Há trechos perigosos e aí necessitamos de mais concentração, de mais confiança, de mais dedicação. A minha mão continua ao alcance da sua.Meus sonhos me levam a você. Meu desejo é seu.

Piso cuidadosamente esse chão esperando você chegar.Adivinho na borra de café nosso futuro. Procuro, nos astros, nossos destinos. Uso bodoques contra batalhões imaginários. Preparo nosso leito com ternura e calor, enquanto faço preces.

Que os anjos estejam nos guardando os corações e nos protegendo dos perigos além desse quintal.Que sigamos confiando, que assim é melhor e mais fácil ir.Que amanhã seja tão bom como ontem e que o amor seja tanto (ou mais) do que hoje é. Que você seja João e que eu seja Maria nesse conto, onde fui coroada princesa por você que é meu “herói, meu bedel, meu juiz”.

Que andemos nus em nosso país, onde, contrariando a linda canção de Chico e Sivuca, o faz de conta nunca terá fim.

Evelyne Furtado

07 de janeiro de 2007.

Evelyne Furtado
Enviado por Evelyne Furtado em 06/05/2007
Código do texto: T477464
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