Sentido no Vazio
Sento-me.
Há algo de mórbido na sensação de vazio.
O falso silêncio me assombra, porque questiona. O silêncio pergunta e fala tudo, sempre. Carrega imagens e cheiros e vozes. Nem sempre eu as quero.
Sento-me.
Há algo de mórbido na sensação de vazio. Mas há algo de belo na valsa entre o ar e a fresta.
O que é hoje? O silêncio pergunta. E responde.
A sala agora tem cheiro de 20 anos. E eu respiro rápido, magoado.
O destino - ou qualquer outro nome que prefira - está sempre em barganha comigo... Nenhum amor é recíproco antes que haja nele algum proveito - uma mudança nos ventos do meu mundo. Nenhuma oportunidade vem quando eu realmente desejo e muitas vêm quando não as quero... E os fatos vão deixando suas marcas para que os veja ir e voltar.
Há sempre uma distância entre mim e tudo. E o silêncio vai me mostrando coisas. E o barulho mais ainda.
Tantos acerto feitos, tantos, mas agora o destino me fez falso. Me fez cheios de laços... mas por favor! Se eu fosse apenas eu - e sem destino - quantos destes seriam meus?
- Tenho medo de expetativas.- confesso envergonhadamente. A voz parecia imatura pelo pouco uso.
- Eu sei.
-Eu disse que tenho medo de expectativas. - minha voz levemente mais volumosa indica um aviso de impaciência, quase loucura.
- Você tem tanto medo de tudo que nem existe. Começa os nós e não os ata.
Empertigo-me. Magoado.
- Então é isso?? É só isso? Todos esse anos e palavras e poemas e verdades...
- Foi você quem disse. - interrompe-me.
Respiro muito fundo, longamente. Sinto um filete quente escorrer no rosto. Decido não dizer mais nada. Definitivamente magoado.
- A sequência desenfreada dos fatos, o destino, o mundo não precisam da sua opinião. Mas você precisa tê-la. O que seria sem a sequência desenfreada de fatos? Quer realmente saber? Nada. Se você fosse apenas o que é agora, se desse apenas a sua opinião não restaria ninguém. Estaríamos para sempre eu, você e o ar pelas frestas.
(Ainda sentado) Há, realmente, algo de mórbido na sensação de vazio