Esmereciano e as Copas do Mundo - parte II

No dia seguinte voltei ao escritório do senhor Esmereciano Paranhos de Andrada, para mais perguntas sobre o futebol brasileiro e as Copas do Mundo.

Laércio: “Em 1934 também não fomos bem na Copa da Itália. A que se deveu esse outro mal desempenho”?

Esmereciano: “Exatamente. Mais brigas entre federações. O profissionalismo começara no Brasil em 1933 e os clubes que tinham atletas contratados não quiseram ceder seus jogadores para a Seleção Brasileira. Somente o Botafogo do Rio não colocou obstáculos para ceder seus jogadores. O alvinegro carioca cedeu Pedrosa, Ariel, Martim Silveira, Canali, Patesko e Carvalho Leite. Para completar o elenco que iria à Itália, a Confederação Brasileira de Desportos, C.B.D., contratou os demais jogadores.

Mais uma vez poderíamos formar uma fortíssima Seleção, mas boa vontade e bom senso nunca imperaram nesses momentos quando falamos de futebol brasileiro.

Jogamos uma só partida, e perdemos para a Espanha por 3 x 1. O goleiro era Pedrosa, o mesmo Roberto Gomes Pedrosa que anos depois foi um grande presidente da Federação Paulista de Futebol.

O “escreque” era formado por Pedrosa, Luiz Luz e Sílvio Hofmann; Ariel, Martins e Canali; Luizinho, Valdemar de Brito, Carvalho Leite, Leônidas e Patesko.

Fizemos mais uma triste figura. Pois o Brasil nunca havia tido tantos jogadores de qualidade como nesse período de 1930 e 1940. Porém nada adiantou, pois a política entre os clubes e federações conseguia sempre atrapalhar o futebol do Brasil”.

Laércio: “Deixando as copas um pouco de lado, gostaria que o senhor me falasse sobre os grandes jogadores que viu ou que teve notícia”.

Esmereciano: “Grandes jogadores o Brasil sempre os teve. Mas vejamos, começando pelo Campeonato Sul-americano de 1919, que foi jogado no Rio de Janeiro e quando conquistamos nosso primeiro título.

Nossos grandes destaques foram Neco, Heitor, Friedenreich, Arnaldo e Amilcar, em Álvaro Chaves, inaugurado naquele certame, com a presença do Sr. Delfim Moreira, então Presidente da República.

Em 1922, foi a vez de aparecerem outros grandes jogadores como Kuntz, Tatu, Rodrigues, Bartô, para levantarem novamente a taça, no Sul-americano, também disputado no Rio de Janeiro. Sempre contra nossos ferrenhos adversários: a Argentina e o Uruguai, e sempre em Álvaro Chaves.

Depois, em 1930 o Brasil também tinha grandes craques como Petronilho de Brito, Friedenreich, ainda em grande forma, Filó, Preguinho, Fausto e Teófilo.

Em 1934 mais uma safra de grandes jogadores. Surgiram Leônidas, Carvalho Leite, Patesko, Valdemar de Brito e Luizinho, do Palestra Itália, de São Paulo. Depois em 1938 mais uma grande fornada de ótimos jogadores como Batatais, Domingos da Guia, Martin, Machado, Hércules, Romeu Pelicciari, Zezé Procópio, Nariz, Tim, Perácio, etc. E depois de 1940 mais grandes jogadores surgiriam: Lelé, Zizinho, Jair da Rosa Pinto, Eduardo Lima, Servílio, Carreiro, Danilo Alvim, Ávila, Tesourinha, Ademir de Menezes, Heleno de Freitas, Rui Campos, Bauer, Noronha, Barbosa, Maneco, Mundinho e outros que não puderam disputar uma Copa do mundo por que a Segunda Guerra Mundial (de 1938 a 1945), na qual quase todos os países participaram, paralisou as Copas.

Aproveitando que estamos falando de grandes jogadores, os argentinos e os uruguaios diziam que o nosso maior jogador era Zizinho, e não Leônidas da Silva. Admiravam o futebol de Zizinho que era um jogador completo, raçudo, técnico e fazia muitos gols, corria o campo todo, não tinha medo de cara feia. Também admiravam Zezé Procópio e Carreiro. Zezé era o típico médio argentino; clássico e raçudo. Não alisava para ninguém. Tanto em partidas no Brasil quanto fora. Era um ídolo para os argentinos. E Carreiro, franzino mas muito rápido era difícil de ser parado sem violência. Driblava na carreira e fazia muitos gols. Também não tinha medo de botinas.

Finalizando, acho que até o aparecimento de Pelé, nunca houve uma preferência por um só jogador”.

Laércio: “O que o senhor poderia dizer da Copa de 1938, na França, quando o Brasil até foi bem representado?”.

Esmereciano: “A Seleção Brasileira de 1938 foi talvez a melhor que formamos. Tínhamos 2 jogadores em grande evidência para cada posição. O futebol brasileiro estava pacificado e na minha opinião houve, apenas, uma falha. Niginho jogava na Itália e era o reserva de Leônidas da Silva. Os nossos dirigentes não se atentaram para o regulamento da competição que dizia que como Niginho atuava pelo Bolonha, da Itália, ele não poderia atuar pelo Brasil.

Justamente contra a Itália, na semifinal, Leônidas não pode jogar por estar contundido. E não tínhamos um reserva à altura.

Nós poderíamos ter levado Carvalho Leite, do Botafogo, artilheiro dos campeonatos cariocas de 1937 e 1938, ainda jogando um grande futebol. Ou ainda poderíamos ter levado Teleco, do Corinthians, artilheiro dos campeonatos paulistas de 1936-37 e 38.

Porém nosso técnico Ademar Pimenta convocou Niginho e no dia do jogo contra a Itália (derrota por 2 x 1) jogou Luizinho que era centroavante do Palestra Itália e que mais tarde terminaria sua carreira no São Paulo, em 1945, como ponta direita.

Enfim, ficamos em terceiro lugar na Copa de 1938, pois seria quase impossível bater a Itália de Mussolini, na França, em 1938”.

Percebendo que o senhor Esmereciano já estava ficando cansado fiquei de retornar em outra ocasião. O senhor Esmereciano iria fazer uma curta viagem no dia seguinte e ficamos de continuar a conversa em seu escritório dali dois dias.

Laércio
Enviado por Laércio em 10/04/2014
Reeditado em 13/04/2014
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