A despedida do palacete
O dia 22 de dezembro de 2010 foi para mim um dia funcionalmente atípico, conquanto inicialmente tudo parecesse, digamos assim, normal. Despertei um pouco cansado, como ultimamente me tem acontecido. Dormira tarde, como de costume e, demais disso, estava alérgico, com obstrução nasal e muita coceira nos olhos. Preferiria, por tudo isso, ficar mais um pouco na cama, embora, contrariando os reclamos do corpo fisicamente cansado e emocionalmente abalado, não pudesse fazê-lo.
Quase sem querer nem poder, levantei-me. A despeito da indisposição, não poderia deixar de ir para o trabalho, pois precisava responder a um ofício do Ministério Público e, mais do que isso, tinha de esvaziar as gavetas, encaixotar o computador, os livros e demais objetos pessoais para a mudança de prédio: o Poder Legislativo deixaria o Palacete “Augusto Dias”, na Marabá Pioneira, e mudar-se-ia para o novo prédio, bem mais moderno e luxuoso, no bairro do Amapá.
Avesso a mudanças, uma vontade quase mal-agradecida não me permitia ficar alegre. Embora talvez não pareça, sou mesmo um romântico quase incorrigível, excessivamente apegado às coisas, pessoas, lugares e instituições. Sempre fui. Estava por isso um pouco tenso, nostálgico e, conquanto fizesse por dissimular, ligeiramente desanimado, afinal ia deixar definitivamente o lugar que ocupava, desde 1.º de abril de 1998: a salinha contígua ao Plenário “Dr. Demósthenes Azevedo”, no primeiro piso do Palacete “Augusto Dias”, onde na companhia de vários outros colegas (Maria do Carmo, Alda Maria, Aquiles, Débora, Vanessa e Claudinha) sempre trabalhei, primeiro como técnico legislativo, depois como procurador jurídico.
Pois bem. Cheguei à sala e meu estado de ânimo não melhorou, piorou. Tudo estava naturalmente desarrumado: caixas de documentos espalhadas pelo piso, pacote daqui, pacote dali, o computador da Alda já desligado e empacotado, a Alda e a Claudinha rodando de um lado para o outro, meio aflitas como duas baratas tontas. Caramba, mudança é mudança!
Não havia clima para trabalhar, nem adiantaria tentar. Não fiz, portanto, o ofício para o Ministério Público e tive, enfim, que, vencendo a resistência, desligar o computador e encaixotar livros e demais pertences. A Alda e a Claudinha precisaram sair antes e me deixarem sozinho, tal qual gato na tapera ou cachorro sem dono, o que faz aumentar sobremaneira minha angústia, meu desânimo. Se precisava sair de lá, tinha de agir logo para fazer isso. Assim o fiz.
Arrumadas as coisas, deixei a sala, já bem tarde. Ao sair no corredor, lembrei-me de que estava saindo da minha sala pela última vez! Não resisti, voltei lá e, calado, olhei tudo novamente por algum tempo. Não pude deixar de me emocionar: seria a última vez que sairia dali como minha sala! Olhei para o relógio e marquei a hora: eram 13h10. Sentindo um nó na garganta, me retirei. Depois, já na Avenida Antônio Maia, no táxi-lotação que me levaria ao novo prédio, peguei o celular, liguei para a Câmelha, minha mulher, e, com voz embargada, exclamei: Acabo de deixar o Palacete “Augusto Dias”!...
É isso. Foi assim minha nostálgica despedida do velho palacete, da qual falaria à noite, já no prédio novo, ao discursar da tribuna da Câmara, na sessão solene de homenagem aos artistas da terra. Para muitos isso pode parecer tolice ou coisa sem sentido, mas para mim tem significação inexprimível. Mas eu sou assim mesmo: um romântico, cheio de muitas paixões, que, sem ser piegas, muito se apega às pessoas, coisas, lugares e instituições. E gosto de ser assim. Pouco se me dá se há quem pense e aja diferentemente.