O homem do parque

Todos os dias às quatro da tarde o homem de boina na cabeça sentava no banco do parque próximo à sua casa para olhar os pássaros.

Costumava se sentar ali e imaginar quando também era pássaro. Lembrava saudosamente das tardes em que sentia a brisa em seu rosto quando alçava voo. Do frio na barriga de todas as vezes que pegava impulso para pular rumo ao desconhecido, ao não aparente, ao não saber.

O mundo não lhe amedrontava. Era parte de um cenário. As luzes do amanhecer, que já vira dos grandes Alpes, focavam sempre nele quando era protagonista de sua peça.

Não se importava de ser um pássaro solitário. A vida era a única poesia que mantinha seu voo. Seu canto podia ser escutado em tantos outros quarterões.

No cair da noite, lembrava-se com orgulho de seus feitos pelo dia. Do voo, do cantar, da brisa em seu rosto... Lembranças.

O tempo ficara escasso para seus voos. Não podia ir muito além que o próprio teto de sua casa. Passivamente, deixou que construíssem uma gaiola. Explicaram-lhe que era mais seguro, e, com o passar dos anos, escolheu a segurança da gaiola à seus voos sem rumo.

Os dias viraram apenas noites: lembranças.

Tornou-se homem. O homem de boina que às quatro da tarde ia ao parque olhar os pássaros.

Não mais voo, nascer do sol ou canções.

Não mais pássaro. Pedra.

Samilly Sampaio
Enviado por Samilly Sampaio em 07/04/2014
Código do texto: T4760041
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