PIPOCA

Uma das situações mais inusitadas que eu já vivi foi ter de explicar para a minha filha mais nova como é que se faz pipoca. Ela é criança ainda, mas curiosa e observadora, e o que deveria ser uma tarefa simples acabou se tornando algo muito complexo para explicar para ela.

Ela perguntou por que na casa da avó dela fazia pipoca na panela, e no cinema não era feita em uma panela – por que não tinha fogo. Ainda, perguntou como o micro-ondas fazia a pipoca.

Eu fui pelo básico: falei que era o calor que estourava o milho. Mas minha filha queria saber mais.

Expliquei que o dentro de cada grão de milho, existia uma polpa que, quando estourava, virava a pipoca... mas ela queria saber como a polpa era tão maior que o milho original.

E além disso, não tinha explicado a diferença das pipocas feitas pela avó, no cinema e no micro-ondas.

Na minha cabeça, eu sabia qual era o processo: calor + pressão interna do amido de milho = pipoca... mas não sabia como explicar que cada um dos modos tinha um catalizador diferente: fogo, vapor e radiação para criarem o calor.

Eu me enrolei inteiro, ao ponto de sentir uma pressão muito grande, uma insatisfação por não conseguir resolver de uma forma simples algo que deveria ser muito fácil.

Vivemos constantemente pressões que, quando mal administradas, fazem com que nos tornamos “milhos de pipoca”, prestes a explodir. Tal como no processo de “produção”, alguns milhos não explodem, são resistentes... mas a maior parte vira “pipoca”.

Mas eu questiono: quem é que tem a aspiração de ser uma “pipoca” ?

Essas frustrações diárias com que convivemos tem o potencial de nos fragilizar, fazer com que percebamos que por mais que conhecemos sobre todas as coisas, jamais saberemos de tudo... e pior: às vezes, fracassamos em expor até mesmo aquilo que sabemos.

Por fim, para terminar o assunto, pensei em utilizar três bexigas: as enchi de ar, e pedi que a minha filha estourasse cada uma delas de uma forma: com uma agulha, com um garfo e fazendo pressão.

Com a agulha, ela fez um furinho que foi esvaziando devagar a bexiga – comparei a pipoca feita com panela e óleo; com o garfo, a bexiga explodiu, e falei que era como funcionava para fazer a pipoca com vapor; e fazendo pressão, ela explodiu também, mas comparei a forma que o milho estourava quando era feita no micro-ondas.

Eu não precisava explicar que dentro da polpa do milho tinha amido e água, que com o calor pressionava a casca para se transformar em pipoca; só precisei mostrar que era possível fazer as coisas de mais de uma maneira... era isso que ela queria saber. Falei que o ar de dentro das bexigas era que nem o interior da pipoca e que, quando estourou, se transformou em algo muito maior.

Muitas vezes, não precisamos saber como as coisas funcionam... mas se temos a curiosidade, devemos ir atrás. Mas invariavelmente, somos incapazes de entender todo o processo e o procedimento. Isso causa frustração, mostra como nós somos finitos e imperfeitos. E por causa dessa nossa incapacidade, simplesmente estouramos como um milho de pipoca.

Resolvi o problema com a minha filha – ela só queria saber mesmo por que dava para fazer a pipoca de formas diferentes. E outros problemas, bem... existe um princípio científico chamado Navalha de Ockam, em que a solução invariavelmente é a mais simples. Mas muitas vezes a solução é complexa demais, insondável.

O maior desafio que devemos ter é saber quando deixamos de depender de nossos conhecimentos e simplesmente resignarmos com a nossa ignorância e incompetência, assim como alguns se voltam a Deus ou em suas crenças na busca de amparo e consolação.

Quanto a frustração... bem, nós não somos milho de pipoca...

SEBASTIÃO SEIJI
Enviado por SEBASTIÃO SEIJI em 24/03/2014
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