Um telefone que ninguém atende

Logo de manhã quando caminho ao trabalho passo por um semáforo que tanto tem de automóveis quanto de entregadores de jornais. São ao menos três jornais diferentes distribuídos gratuitamente aos motoristas que aguardam o sinal ficar verde – e ainda bem que são gratuitos, pois não imagino que haveria disposição suficiente para comprá-los. Da minha parte, espero que o semáforo abra e os entregadores venham para a calçada, quando então trato de pegar logo os três jornais do dia. Chegando ao trabalho, sento diante do computador e, enquanto ele carrega, folheio todos eles. Em geral não leio mais do que as manchetes, no máximo os leads, raramente a notícia inteira. Dali a pouco já estão todos na minha cesta de lixo. De toda forma, ainda posso dizer que eu, jornalista, também leio jornal.

É claro que há algumas notícias que chamam mais a atenção do que outras. Hoje nenhuma me atraiu mais do que aquela dando a entender que os telefones dos passageiros do avião que sumiu na Malásia continuam tocando – quatro dias depois dele desaparecer sem deixar vestígios. Até o fechamento da edição não havia explicação plausível para isso, pois presumia-se que o avião havia caído no mar ou se desintegrado em pleno voo, e nem mesmo a tecnologia asiática é capaz de garantir que funcionem nessas circunstâncias. Em todo caso, como há sinal, podemos concluir que não havia clientes de operadores brasileiras a bordo. Fala-se em OVNIs, portais para dimensões paralelas, mas nada explica o sumiço. Até o momento estou aceitando o que diz um personagem do Harry Potter, segundo o qual os trouxas, quando se deparam com algo cuja explicação óbvia é magia, preferem criar explicações das mais estapafúrdias, enxergando nelas lógica e razão.

Tudo isso me ocorreu lendo os jornais de hoje. Absolutamente passei por cima das notícias relacionadas à Rússia e à Ucrânia, pois sobre a paz mundial nunca há muito a dizer – é sempre um telefone que toca, toca e ninguém atende.

Henrique Fendrich
Enviado por Henrique Fendrich em 11/03/2014
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