TUNINHO DA BRANCA.
Meados dos anos 70, ele fazia sambas. Sambas lindos, alguns trago de cor. Ídolo anônimo, herói das quadras, rei dos versos e melodias, mestre artesão da arte e da vida onde me criei. Ouvindo-o aprendi a falar de amor, a registrar cotidianos, a expressar sentimentos, cortejar... Segui-o à frente de um gigantesco cordão, desfilando seu talento pelas passarelas de barro da comunidade, dando voz a um povo antes sem vez. Ainda garoto, impulsionado pelo sopro de suas asas, flutuei sobre o universo das harmonias, armei-me de violão e cavaquinho, fiz uso de seu arsenal de belos sambas em ataques culturais por tardes, noites, madrugadas sem fim...
As rádios e jornais anunciaram seu nome com entusiasmo quando a polícia prendeu o malandro procurado... Décadas se passaram e os sambas do poeta, antes entoados com euforia, iam agora se desbotando em sua longa ausência no cárcere. As novas gerações, com sede de substituir antigas culturas, apagam vestígios de civilizações, dilaceram histórias em seu eterno digladiar no coliseu dos tempos... O reencontrei após décadas. Abracei-o como se fosse antigamente, cantei seus sambas, mostrei-lhe um outro samba, vencedor de um festival, que eu havia feito em sua homenagem...
"Lindo querubim." O velho malandro sorriu em pianíssimo, meio semitonado... Tuninho da Branca, o homem-inspiração, mestre em "sambologia." Hoje doutor em ciências de bons conselhos... Conselhos que me ajudaram a nunca sair do tom, a jamais descompassar na execução frenética do dia a dia em alegrete na sinfonia trágica da favela... Tuninho da Branca, malandro regenerado, homem livre que agora sorri com o mesmo vigor dos tempos antigos, tempos em que seus velhos sambas arrebatavam enormes legiões de moradores...
-"Obrigado, professor, por sua arte, suas dicas, suas lições... Valeu, Tuninho da Branca!"