LEMBRANÇAS MINHAS DELA

Daqui a alguns dias, fará dois anos que minha irmã partiu. Nesse tempo, que me faz lembrar mais intensamente sua presença em minha vida, faço também uma relação dos ensinamentos que apreendi com ela.

Uma pessoa vira o nosso ídolo, ou nossa amiga, não de uma hora para a outra. Há muita emoção envolvida no processo, muitas experiências que nos fazem admirar e querer essa pessoa sempre ao nosso lado. E nos faz sofrer por ela não estar mais perto de nós.

Minha irmã sempre esteve do meu lado, principalmente naqueles momentos tumultuados, em que necessitamos de um ombro ou uma palavra de força. Ela estava lá, mesmo de longe, pelo telefone.

Foi uma pessoa que fez tudo o que quis na vida, conheceu pessoas de todas as áreas e meios sociais, viajou o mundo para onde quis. Para isso, trabalhou em três horários e aos fins de semana, sempre sem perder o foco. Mudou de casa várias vezes até chegar àquela que pensou ser a melhor para a família, para criar seus filhos com conforto e tranquilidade.

Ela ajudou muita gente, sempre com o desprendimento necessário para o que der e vier, sem pensar em retorno. Surpreendi-me quando, ao acompanhá-la em seus dias de tratamento no hospital, ouvi várias das suas histórias de caridade e sofrimento pelo sofrimento do outro. Eu tinha vaga ideia sobre essa atitude dela, mas ouvi-la foi muito bom.

Aprendi com ela inúmeras coisas. Quando estava com a boca repleta de herpes, sem conseguir mastigar e engolir a comida sólida e temperada, fazia o esforço sobre-humano para se alimentar. Dava sugestões de cardápio, que não podia variar muito, para ver se dava para fazer descer aquela canja ou sopinha de batatas insossa que vinha. Eu pensava: “Poxa vida, quando tenho uma afta, reclamo demais e ela está aqui lutando contra a morte e tentando se alimentar com a boca inteiramente machucada.” Aprendi.

Lutar! Como aprendi! Desistir nunca! Claro que, sendo humana, às vezes fico abalada, mas o pensamento volta nela, na cama do hospital, e tento não me abater. Acabei de ler uma fala do padre Leo que diz não acreditar em quem não chore. Puxa! Se ele me conhecesse, como gostaria de mim!! No sofrimento, na alegria, na emoção por um filme ou até propagandas, em espetáculos primorosos... como choro! Por ela, chorei todos os dias no primeiro ano, mas agora as lágrimas estão em menor quantidade, as lembranças dela as substituem.

Quando pensei em escrever este texto, queria fazer uma homenagem a ela, pra dizer quanto aprendi ao seu lado. Mas está sendo mais que isso, desabafo puro de um coração partido e sofrendo. Se ela pudesse me ligar agora, iria me xingar demais! “Deixa de ser boba! Palhaçada!! Para com isso!” Parece que estou a escutando.

Já liguei várias vezes para ela reclamando do meu serviço e dizendo que iria desistir e pedir conta. Ela dizia com firmeza: “Nada disso! Quando se sentir assim, respira, toma um remedinho e aguenta firme! Não adianta desistir porque só vai mudar de lugar, é tudo igual!” Sigo isso sempre, nada de jogar a toalha.

Na nossa vida, temos que ter pessoas em quem nos espelhar, que podem nos servir de guia para o dia a dia ficar mais leve. Bom seria se elas estivessem sempre perto, para ouvir sua voz e olhar sua fisionomia de brava ou de orgulho se você faz algo que lhe agrada. Bom seria...