ANONIMATO. DUAS FACES.

O anonimato vestido com a indumentária de negatividade é insidioso por um simples motivo que não reside na clandestinidade do gesto, mas na impossibilidade da retorsão que a própria lei garante e na impossibilidade de ação contrária. O anonimato curial, desimportante, simplório, é tolo, não tem importância nem na omissão da identidade ou sinalização que pretende, carrega o selo da falta de publicidade e sofre mais de sua ferida do que pode fazer sofrer, parte sempre de inteligência inferior que teme enfrentar, e desconhece a força da publicidade tanto quanto a neutralidade do anonimato, por isso digere-o a própria fraqueza, intestina, e se excreta no próprio anonimato pela origem e fonte de partida.

O anonimato criminoso é diverso por ser importante, vir à publicidade, descoberto seu resultado e origem - a lei pune exclusivamente o resultado e não a intenção - desembocando em crime contra a pessoa em sua personalidade. O pior deles, se articula na engenharia de bastidor, como ocorrido com o cinegrafista Santiago. Os mentores do caos colhem benefícios. Usam outros braços que não os seus, como se viu, no insuflar cabeças sem formação para desestabilizar mais ainda o que já está desestabilizado. Não se garantem às famílias, como ocorreu em junho passado, manifestações legítimas, garante-se na estrutura dos bastidores, na sombra do anonimato, sem assumir responsabilidades, hediondos resultados como o recente homicídio.

O anonimato edificante há de ser positivo, ele traz a excelência do gesto e a grandeza espiritual. Influencia o que de melhor existe no mundo. Só os anônimos desinteressados de celebrização marcaram pela presença, embora no anonimato continuassem recolhidos, mas não conseguiram escapar da fama. Suas escolas de ensinamentos deixadas estão acima da pobreza interior, são sustentadas no que outorgaram à humanidade. São históricos e reverenciados.

Esses anônimos nunca buscaram do anonimato sair, mas influenciaram a humanidade de tal forma que sem eles o conhecimento seria paupérrimo, são eles a quem o conhecimento de ponta acorre para usufruírem de plena luz.

Somente para citar um dos maiores, apontamos Sidarta Gautama, o Buda, o príncipe que queria só o anonimato, mais nada. E em lista interminável de grandes cérebros reclusos, citamos a quem nunca saiu de sua pequena Kronesburg na Alemanha, lá ficando recluso, e mudou a filosofia contemporânea, Kant.

Tenho amigos, não poucos, que buscaram fama na ciência do direito e em outras áreas. Realizaram o objetivo por amar e terem mérito no desígnio. São juristas, pintores, pensadores, escritores. O mundo, o homem caminha nessa direção, a pretensão de ter fama, entende-se. E alcança-se fama, leia-se sucesso, mas só os que têm substância e são reconhecidos por suas atuações e têm valor.

Outros de máximo reconhecimento recusam holofotes, mas todos têm mérito e são festejados.

Só espíritos mais elevados compreendem a falta de necessidade dessa corrida. Simplesmente conceituando, quando o gato que ser leão e aparecer pela força sem que a tenha, e a galinha quer voar como águia quando se arrasta pelo chão com asas curtas, terá o tempo a lhes mostrar suas verdadeiras dimensões, pequenas. A natureza é sábia e dá clareza a quem não enxerga, e o tempo é implacável. A palavra é essa, compreensão para compreender o que somos.

Quem tem riqueza interior não precisa viver em grandes tribos, e muito menos deseja sair do anonimato para ser conhecido na proporção de seu desejo, antes recusa esse palco. Palco é para artistas e poucos o são, e eles mesmos depois de atingida rejeitam a fama. Todos tem dimensionamento reservado para sua atuação. O anonimato não tem muitas faces, tem só duas, a sombra e a luz. O crime e o mérito.

Celso Panza
Enviado por Celso Panza em 20/02/2014
Reeditado em 20/02/2014
Código do texto: T4699315
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