Uma bruxa, a dona da casa
Ela é forte, dona de um temperamento guerreiro, olhar de quem não teme as reviravoltas da vida. A despeito de uma aparência miúda, só lhe sobraram um olhar marcante, olhos negros, desafiantes, destemidos.
Talvez por isso, ou talvez não, o destino caprichou nos encargos sobre os seus ombros. Dois filhos para criar sozinha, inclusive sem a ajuda financeira do pai das crianças. E a moça, que não era de se entregar nem nada, deu conta do recado completamente. E não é que conseguiu comprar o seu apartamento? Recebera uma indenização da empresa em que trabalhara por muitos anos, onde entrou como correspondente datilógrafa e saiu como técnica de controle econômico/financeiro, não sem antes trabalhar como secretária por uns bons anos. Comprar o apartamento foi um perrengue. Surgiu então uma dificuldade, pois que um imóvel não se compra todo dia, como iria comprar o seu? Não era exatamente comprar banana no mercadinho. Com a indenização que recebeu, daria para comprar dois imóveis. Mas isso ela descobriu bem depois, quando começou a entender como é que esse mercado funcionava. Enquanto não sabia, teve que ficar muito tempo pesquisando, e ainda vencer o medo de entrar numa fria. Quando finalmente se sentiu segura comprou o apartamento e, nessa altura já tinha também comprado um carro. Rende também uma crônica esse tal carro, mas fica para depois. A verdade é que, quando comprou o apartamento já tinha-se ido boa parte do seu dinheiro, então comprou-o em três parcelas. A última delas dependia da venda de um imóvel cujo dono lhe havia tomado emprestado o valor da parcela, dizendo que rapidamente venderia o imóvel que possuía e lhe devolveria o valor tomado emprestado. Passou-se um ano, dois, três, mais.... e nada.
Tomou então uma decisão radical. Pois bem senhor: já que não vendes o imóvel, passe-o então para o meu nome e quite a sua dívida para comigo. A negociação foi um caso de novela. Mas enfim, acertaram-se. Apesar de, do ponto de vista dela, a negociação não estivesse sendo justa. O dono do imóvel aceitou passar o imóvel para o seu nome, desde que ela lhe devolvesse uma certa quantia. Embora achando injusta, afinal havia esperado quase cinco anos pela devolução do dinheiro que lhe fora tomado emprestado e ainda assim, afinal, não lhe estava sendo devolvido, mas sim sendo feito uma troca e com troco?! Mas, guardadas as devidas proporções pensou que seria melhor abrir mão de uma parte do que perder um todo. E assim foi fechado o acordo. Ela devolveria uma certa quantia que foi também parcelada, e então pegou a chave da casa. Pretendia alugar ou vender, apesar de estar ciente das dificuldades, pois há mais ou menos cinco anos o antigo dono já vinha tentando faze-lo. Um belo dia recebeu um contato telefônico. Do outro lado da linha alguém interessado em ver a casa. Marcaram horário e acertaram tudo. Ela já havia vendido o carro. Foi mesmo é de ônibus, metro, lotação, que tudo isso era necessário para chegar lá. Já próximo do destino, na lotação, passou por uma casa que vendia material de limpeza ela lembrou-se de que a casa precisa de cuidados. A lotação parou e ela comprou alguns produtos mais uma vassoura.
Já estava atrasada. Quando chegou a pessoa interessada já estava no portão à sua espera. Situação bizarra. Ela subindo a rua com uma sacola de produtos e uma vassoura na mão, já que vassoura não costuma ser embrulhadas na compra. Ao se aproximar identificou-se para a pessoa que a esperava que muito surpresa e sem disfarçar nada diz:
- Ah, mas é você a dona a casa?
- Puxa! Estou aqui esperando que me apareça uma Dona paramentada num belo carrão e ela aqui me aparece à pé e ainda com uma vassoura na mão!