A sangria do Brasil
Procurei o telefone de Renato Toniolo, antigo colunista social de Curitiba. Fui informado de que ele já estava morto. Não era verdade: encontrei Toniolo aposentado, enxergando mal de uma vista e nada da outra, com falta de oxigenação no sangue, mal conseguindo se locomover – mas ainda vivo, como não pude deixar de notar. O que havia morrido era apenas o seu passado, cheio de histórias divertidas dos clubes que frequentava e das colunas que escreveu por 35 anos. Mas ali na minha frente ele voltava a se lembrar e ria como se ainda fosse a mesma época.
Contou que o Círculo Militar, logo após do Golpe de 64, havia promovido um Baile do Chopp na cidade. Em sua coluna, Toniolo noticiou o evento, mencionou as autoridades que estariam presentes e acrescentou que o General Aragão faria a sangria do barril. No dia seguinte, o próprio General ligou para o colunista e começou a xingá-lo. É que em vez de sangria do barril ele havia escrito sangria do Brasil. Foi uma confusão danada. “Pensei até que ia ter que fugir para o Paraguai”, contou em meio aos risos.
Um dia Toniolo estava sem notícias para a sua coluna e decidiu inventar uma notinha para preencher o espaço. E escreveu: “Num jantar realizado na Sociedade Esperança, o diretor de um clube de Curitiba resolveu fazer uso da palavra e, no que fez, voou a sua dentadura em cima da mesa”. A nota fictícia foi publicada e no dia seguinte havia mais uma ligação enfurecida para Toniolo: “Escuta aqui! Isso que você escreveu no jornal é comigo?”. Era um grande amigo de Toniolo – e devia usar dentadura.
De vez em quando ele também escrevia notícias frias pra enganar o pessoal que cobrava direitos autorais nas festas. Mas o que ele gostava mesmo era de circular nos clubes. Costumava divulgar clubes menores, sociedades beneficentes em geral.
Toniolo olhava para o teto e via as histórias dessa época passarem como um filme. E creio que foi a última vez que as viu, porque logo depois ele morreu pra valer.