Sobre oÓdio [EC]
“Eu sei que vou te odiar”. Esta é a proposta de nosso EC de hoje. Confesso que de todos os temas este foi, está sendo, o mais difícil. A quem devo odiar? A quem dirigir o meu ódio? Diante destes questionamentos descobri que sei pouco sobre o assunto sugerido. Então, o jeito foi fazer umas leituras rápidas e procurar argumentos para meu texto.
Descobri que para Montaigne o ódio equivale a uma paixão que arrasta consigo a consciência e a razão; para Freud e Lacan o ódio é o correlato do amor. Para Aristóteles uma cólera que serve de arma para a virtude e a valentia.
Outras definições encontradas em dicionários: extrema aversão, hostilidade, animosidade, desejo que o mal se abata sobre o objeto odiado, emoção que exige ação. O ódio, portanto, é uma emoção humana normal, como o amor. Sendo mais exato, o sentimento oposto. O ódio rejeita, o amor aceita. O ódio ataca, o amor defende. O ódio é separação, o amor é conexão.
Segundo Leandro Karnal* o ser humano tem muita resistência em assumir que faz guerras, que é preconceituoso, racista, intolerante e em reconhecer o mal que lhe habita. É como se acreditássemos que as manifestações de ódio e ira estão sempre no outro, no estrangeiro, no vizinho.
Entretanto, segundo ele, o ódio está presente em nosso cotidiano, mas ainda ausente de nossas reflexões. Os discursos propagadores do ódio, nas mídias sociais, através de mensagens e expressões discriminatórias, repletas de ideias preconceituosas, cruéis, arrogantes, chocantes, infundamentadas, que estigmatizam indivíduos e/ou grupos, negando um estatuto de igualdade e ferindo a dignidade das pessoas componentes destes grupos são um claro indicador do quanto o ódio está presente em nossas relações.
Pois é Leandro, apesar de me revoltar contra muitas coisas – injustiças, violências (todas elas), etc., não me considero capaz de odiar. Pensei que odiaria aquele que destruiu meus sonhos de menina, ferindo tão profundamente minha auto-estima que, durante anos, senti-me incapaz de olhar para mim mesma; ou quem me traiu e destroçou minha confiança; quem me caluniou, difamou e magoou, entretanto não lembro mais seus rostos, suas vozes, seus olhares. Sobrou a indiferença. Seria esta uma forma de ódio?
Entretanto, reconheço, o ódio reside em mim. Travo lutas homéricas contra ele toda vez que vejo uma criança sendo ultrajada em seu direito a uma família, escola, saúde e lazer, uma mulher sendo violentada, um ser humano sendo arrancado de seus sonhos...
E por ser tão imperfeitamente humana, odeio saber que ainda não venci esta luta.
*Doutor em História Social pela PUC.
Este texto faz parte do Exercício Criativo - Eu Sei Que Vou te Odiar
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http://encantodasletras.50webs.com/euseiquevouteodiar.htm
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