Retalhos...

Às vezes, na madrugada, insone, abro a janela do passado e deixo entrar imagens queridas de outros tempos...

E vejo por entre brumas a saudade brincando com minhas lembranças.

E uma delas corre ligeira ao meu encontro, adiantando-se as outras, e me envolve num abraço de ternura.

Me vejo então ainda menino, correndo descalço pelas ruas de terra batida da querida Pinheiral, cidadezinha do estado do Rio, onde vivi minha infância...

Na ansiedade de menino, buscava uma emoção que me fazia tremer de alegria e ao mesmo tempo enchia meu coração de temores...buscava não sabia o que e não sabia onde.

Não entendia ainda que minha alma buscava a fugidia flama da felicidade...

Na ingenuidade da infância não percebia que a felicidade estava ali ao meu lado, na terra quente sob meus pés descalços, no frescor do vento que acariciava meu rosto, nas flores silvestres que enchiam meus olhos de beleza e cor, no cantar dos pássaros em sua eterna canção, no sabor incomparável das frutinhas do campo que me adoçavam a boca...

Repentinamente tudo escurece...o céu antes límpido se torna tempestuoso...um vento forte ameaça tudo destruir...

Tudo acontece muito rápido, mal consigo entender o que se passa...

E a vida, antes calma e serena, aparece de repente agitada, febril, e me diz baixinho como se não quisesse me magoar explicando tantas mudanças: é o tempo...

É o tempo que destrói nossos sonhos, embrutece nossos sentimentos...

É o tempo que com a poeira da desilusão cobre as flores das nossas esperanças e com a força do esquecimento quer tirar de nós nosso bem mais precioso: nossas lembranças...

Antes de fechar as cortinas do passado para não me molhar no vendaval de lágrimas que se aproxima, vejo num relance a saudade, rápida, recolhendo minhas lembranças para guarda-las em um lugar seguro, bem no fundo do meu coração.

E vou dormir abraçado com a tristeza, minha companheira que sempre aparece nessas horas, que nunca me deixa trilhar sozinho os caminhos do meu destino...