Poema sem volta...
Quero soltar meus versos, ao centro de uma praça, solitariamente... Correrão inaudíveis aos que ali passarem. Soarão totalmente voluptuosos, porque ali não é um corpo que se desveste... É uma alma que se desvela. Cairão os pássaros ao chão, atônitos; argumentarão talvez os sonhos que ali se aninham nas mais altas árvores... Talvez a senhora que ali, marafona, me dê ouvidos, e chore de saudade do tempo que não lhe faltava pão pela riqueza de seu agridoce ofício, em que declamava poemas tão concretos em tantos ouvidos desconhecidos... Relerei Baudelaire destoando seus intentos... Sentarei a olhar o Gato Preto que escapou de uma parede qualquer aprisionado metaforicamente, ou talvez denotativamente, por Edgar Poe... Muitos me olharão, mas não me verão... pois serei só um zunido empurrado pelo Minuano estampido do Sul de minha Nação... Serei sol a mim mesmo, lua para moça que espera ansiosamente que me cure de minha insanidade, serei o espirro provocado, por uma alergia ao novo, a um misantropo... Quero, quiçá, me declarar totalmente sacrílego à última flor do Lácio, por não pensar nas consequências de tentar materializar os descampados de minha alma... Sendo uma peste que soa lentamente a separar corações... pai de filho, mãe de filho, mãe de pais e filhos... Talvez me sentirei culpado, por isso, e cairei por terra, e levantarei dali humilde, humos, a reiniciar cada versinho não tentando escalar inconsequente e tão despreparadamente o topo dessa montanha que nasce onde o sol se põe...
(marcio j. de lima)