Dor, dores

Qual é a visão da dor?

Um rosto modificado pela vontade de chorar?

Um rosto sério por conter a dor?

Aquela senhora idosa sentindo tanta dor.

De início, aguentou calada.

Deitada em sua cama, tentando distrair-se vendo televisão.

Mas percebendo que ninguém se preocupava com ela, preocupou-se.

Pediu-me ajuda, foi prontamente atendida.

É que ninguém sabia.

Imediatamente levamo-la ao hospital.

Como gemia de dor!

Carregada no colo foi levada ao carro e gritava.

Caíra e pensou que havia sarado.

Que nada, tinha piorado.

Como em muitos hospitais do Brasil ela teve que esperar pelo atendimento.

Mesmo idosa, teve que esperar.

A equipe médica era constituída por poucos profissionais.

Sentada numa cadeira de rodas, ela aguardava, observando tudo a sua volta.

No início fazíamos brincadeiras com ela, para não ficar ansiosa.

Depois fomos vencidos pelo cansaço e ficamos todos quietos.

Víamos chegarem ao Pronto Socorro, pessoas com problemas de saúde mais graves.

E a espera foi-se estendendo pela noite a fora.

Às vezes, eu olhava para ela, que estava calada, quieta e só via filetes de lágrimas saírem dos seus olhos envelhecidos pelos anos.

Mas tranquila, sem mexer com as pernas não sentia dor.

Escureceu, deram vinte horas, vinte e duas horas e nós lá, sonolentos, mas firmes!

Quando foram 23; 45 horas chamaram-na para ser atendida.

Alívio!

Empurrando a cadeira com dificuldade, lá fomos nós.

Eu sem forças, dando forças para ela, a gente ria.

Eu sorrindo, com dor nas costas.

O riso vencendo a dor!

Deparamos-nos com médicos cansados, olhos vermelhos.

Cada um dedicou –se a um paciente.

Consulta pronta, hora dos exames.

Raios x pra lá, tomografia pra cá.

E a gente circulava por aqueles corredores frios.

Corredores com gritos de dor, dor de crianças, gemidos de adultos.

A medicação?

Depois que começasse outro turno de médicos.

Somente pela manhã.

E a idosa com fome.

- Quero um marmitex!

Dizia ela.

Mas não podia comer nada, recomendação do enfermeiro responsável.

-"Somente água e pouca de cada vez".

Dificuldade para levá-la ao banheiro.

Sem ter como fazer, eu a pegava pela cintura e arrastava até ao vaso sanitário.

Hospital público não tinha ninguém para ajudar.

E ela sorrindo falava:

- Você vai ficar descadeirada!

Vencida pelo sono e cansaço pedi ao filho dela que aguardava no carro lá fora, para ficar com ela até amanhecer o dia.

Hora de tentar cochilar um pouco em macas ou em bancos.

E eu fui tentar cochilar no carro.

Que nada, se dormi, foi uma hora somente.

Preocupada com o ambiente lá fora e uma lâmpada de luz amarela em frente, foi difícil!

Liguei o rádio e fiquei ouvindo besteiras.

Até que amanheceu.

O tempo fresquinho, uma brisa suave.

Saí do carro, espreguicei, arrumei os cabelos.

Com muito sono ainda e o corpo dolorido saí à procura de um lugar que vendesse um cafezinho.

Encontrei um barzinho logo a frente que atendia ao pessoal que ia trabalhar.

Apressados tomavam o café, compravam o jornal e saíam rapidamente.

E eu, sem pressa, terminei e voltei ao hospital.

Liguei para o acompanhante e soube que o médico atenderia em breve.

Trocamos de lugar.

Mais uma longa espera.

Quando foi dado o laudo, choramos juntas.

As nove horas da manhã.

Nada sério, uma inflamação que melhoraria com analgésicos e antibióticos.

Repouso absoluto.

Hora de ligar para a família dela, que se refugiaram em suas casas, tranquilos, em suas camas para dormirem a noite toda.

Ela, uma senhora viúva dormia sozinha e somente um! Um dos seis filhos se dispôs a dormir com ela. E eu, como mulher, para levá-la ao banheiro, também fui.

Enquanto ela esteve na cadeira de rodas eu dava o banho também.

Pedi um ventilador a uma das filhas e a outra para levar almoço e jantar para ela.

Os outros filhos nem lá foram para visitarem-na, telefonavam para saberem notícias.

Havia manhãs que eu a aconselhava após o banho:

Perfume-se, use um creme hidratante na pele, passe batom, ponha joias, vista uma roupa nova, mostre para eles que a senhora está muito bem sem eles!

E ela foi melhorando.

Depois de usar o andador, soltar-se do andador e segurar nas paredes, agora anda sozinha, faz café pela manhã faz almoço e senta na área em frente da casa para receber o sol matutino e do começo da noite.

Às vezes ela me chama e pergunta:

- Estou bonita?

Claro!

Venceu uma batalha!

Após algumas crises leves de depressão, normais.

Recebeu visitas do professor e colegas de ginástica.

De amigos e vizinhos e está animada.

Apesar de que às vezes vejo uma pitadinha de tristeza em seus olhos, pela ingratidão dos filhos.

Deus me abençoe para que eu não passe pela experiência da ingratidão dos meus filhos, porque dói.

Edmeia
Enviado por Edmeia em 07/02/2014
Código do texto: T4681633
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2014. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.