DÁ PARA SER FELIZ COM POUCA COISA.
Ir à escola nunca foi um dos meus maiores prazeres, aliás, ainda hoje não vejo muita graça em estudar, mas apesar de tudo, procuro fazer o combinado. Poucas foram as vezes em que tirei “A” nas matérias do ensino fundamental - mas quando conseguia, a alegria era comparada à mesma de reencontrar aquele amor que você um dia perdeu.
No colegial, com muito esforço, mantinha 8 de média em quase todas as matérias, menos em matemática: vida dura, hein professora Deise? Literalmente ela suava para fazer com que eu tirasse a nota limite para fechar os bimestres, mas quando se tratava de língua portuguesa, se eu tirasse menos que 10, praticamente entrava em depressão: fiquei várias vezes deprimido. Fiquei deprimido também porque nunca conseguia acompanhar o que o padrão capitalista ordenava às pessoas. Meus pais sempre foram muito humildes, se é que me entende. Passei muitas vontades. Quem dera minha mochila fosse igual o do meu amigo rico, Alex. Ainda me lembro das inúmeras vezes em que pedia para carregá-la até a escola, mesmo pesada, só para sentir o gostinho de ouvir as meninas dizerem: “olhem, a mochila dele tem um relógio atrás”. Ah, como era gostoso! Cuidava dela como se fosse minha.
Na quarta série, na E.E.P.G Antonio Alves da Costa, já era costume após o lanche, os professores levarem seus alunos para fazer a higiene bucal. Então o meu amigo Alex sacava da mochila aquele creme dental sabor tutti frutti, que vinha numa embalagem linda, que dava vontade de escovar os dentes mesmo quando bebia somente água. Com um sorriso amarelo, não no sentido literal, eu não deixava barato: sacava também de dentro de uma bolsa - a mesma que meu pai usou durante muito tempo para fazer seu trabalho cristão – um tubo de alumínio do creme dental da marca Kolynos, que hoje não existe mais: o conteúdo era branco e sem sabor algum, não dava vontade de usá-lo nem depois das principais refeições.
Contudo, eu era feliz. Sempre tive família. Hoje não tenho mais vontade de escovar os dentes com creme dental com cheirinho de chiclete. Tenho coisas mais significativas para conquistar neste novo tempo. Se consigo? Muitas vêm fácies como pegar um pouco da “pasta” de dente do meu amigo rico, outras, ainda estou com a mesma cara a qual olhava para sua mochila moderna. Aprendi a ser feliz com poucas coisas e a fazer com elas grandes momentos. Foi com a Kolynos que meus dentes se mantiveram branquinhos e, foi também com a ajuda daquela bolsa de pastor a qual meu pai usava, que hoje consigo escrever essa história de maneira que você leia até o final sem titubear no primeiro parágrafo. Aproveite a vida. Se não tem namorada, vá ao parque com a irmã mais velha, vá ao cinema com as sobrinhas, mas não deixe o tempo passar em branco. Em branco mesmo, só os dentes. Dá para ser feliz com pouca coisa.