A queridinha do pai, a queridinha da mãe e a coitada

Meu filho não assiste mais tevê comigo. Minha filha também já não faz isto há muito tempo.

Entendo que estão crescendo. De vez em quando aparece aqui no quarto para dar o ar da graça. Entendo que a consciência pesa e ela decide aparecer no intuito de querer insinuar que se importa comigo, quando na verdade não.

Não lembro quando foi a primeira vez que me senti desprezada e desprezível assim.

Sinceramente não. Mas já acontece há muito tempo.

Quando tive meu último filho tinha meio que um orgulho em provar por A+B que todo pai e mãe tinham um filho preferido e eu não era exceção à regra. Sempre soube quem era a filha preferida do meu pai e quem era a filha preferida da minha mãe. Somos três mulheres, então como fica a que não é preferida?

Simples: meu pai morreu e a preferida dele ficou sem atenção. Minha mãe transferiu um pouco de afeto àquela que menos carinho recebia. A “coitadinha” como o finado mesmo se referia, enfim passou a ter vez.

Engraçado como me vem à tona agora o pensamento de que a preferida do pai e a “coitadinha” tiveram os mais sérios problemas na vida. Desde psíquicos passando por físicos e mentais. Já a queridinha da mãe reina até hoje como eterna dona da casa. Manda e desmanda no que, a seu ver, é só dela e somente ela tem direito à.

E como ficou aquela preferida do pai? Só. Visto que a mãe entregou-se a cuidar apenas de sua preferida e da “coitadinha”.

Entendo o que me lembro, e me lembro de sempre ter muita garra, força de vontade de que as coisas deem certo que eu consiga subir mais alto. Confesso que às vezes fico perdida na ânsia de que tudo se resolva e que eu fique bem.

Por pior que fosse minha vida de casada em minha própria casa era o que me fazia feliz. Meus filhos eram meus e eu podia ter seu amor.

Meus filhos não veem tevê comigo.

Não sou mais a filha preferida.

Kátia Santvs
Enviado por Kátia Santvs em 20/01/2014
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