Luzinha azul

Já faz algum tempo que estou com novos vizinhos de quarto. É um casal com mais de 50 anos, parente da Dona Lúcia, minha alugadora. Eles não são de Brasília e, pelo que entendi, também não vão ficar muito tempo na cidade. Moram aqui do meu lado, posso escutar as suas conversas, sei o que assistem na televisão, mas raramente acontece da gente se encontrar durante o dia. Mesmo assim, costumo me lembrar deles quando vou dormir.

É que a janela do meu quarto faz frente com a garagem da casa. Para melhor receber o casal, Dona Lúcia tirou o carro dela de lá e botou Deus sabe aonde. Agora o carro que está lá é o dos meus novos vizinhos. Como é natural, esse carro tem um sistema de alarme. E para que todos saibam disso há uma luzinha azul piscando incessantemente em cima do painel. Quando apago as luzes do meu quarto e me deito para dormir, vejo essa luzinha iluminando a minha cortina.

Na primeira noite achei que não conseguiria dormir com todo aquele brilho em cima de mim. Mas pensei no aborrecimento que seria me levantar àquela hora, acordar um casal que eu nem ao menos havia conhecido pessoalmente ainda, e pedir que, por favor, desligassem a luzinha do alarme para que eu pudesse dormir. Cogitei então ir até o carro e jogar um pano ou algo parecido em cima do painel, pelo menos por aquela noite. Mas não sei se eu estava especialmente cansado naquele dia ou o quê, o fato é que quando dei por mim eu já havia dormido, com luzinha e tudo.

Veio o dia, eu sai de casa, e quando voltei à noite encontrei o carro lá estacionado, mas dessa vez sem a luzinha. O casal deve ter imaginado que aquilo me causasse algum desconforto e trataram de desligá-la por conta própria. Fizeram isso também nos dias seguintes, mas de vez em quando eles se esquecem e minha janela continua brilhando. Só que agora eu não me incomodo mais. É tão sem graça olhar pela janela e ver uma garagem fechada que não deixa de ser um alento quando há um pouco de iluminação entrando por ela.