Insignificâncias

Sempre que vou à feirinha do Largo da Ordem eu tento entender Hélio Leites. Mas até hoje não consegui identificar onde termina o homem e começa o personagem. Hélio é um miniaturista, faz a sua arte de coisas pequenas como um botão, um palito de sorvete, uma casca de pinhão. Leminski dizia que se tratava de um significador de insignificâncias. Com esses objetos já desprovidos de valor, Hélio inventa pequenos produtos para divertir e fazer pensar.

Dentro de uma seringa, por exemplo, colocou um boneco de Santo Antônio e chamou a obra de “Injeção de Ânimo”. De um palito de sorvete fez o “Indicador de TPM”, que consiste em uma arara usada como botton pelas mulheres. Colocou um boneco em cima de uma mola e disse que equivalia a um São Longuinho para as pessoas que não pudessem dar três pulinhos. Outro bonequinho deve ser usado como vodu light e malhado antes de dormir. No outro dia a pessoa nem se lembrará que estava com raiva – para Hélio, é a doença que mais mata no mundo.

Há ainda miniaturas grandiosas como “As Duas Mortes de São Sebastião” e “A Cama de Van Goch” que aproveitam muitas caixinhas de fósforo. Enquanto explica suas criações, Hélio veste um jaleco no qual está todo o seu Museu do Botão – sem conhecer uma coisa que está na sua camisa, você não saberá o que se passa a um quarteirão de distância, explica.

Hélio diz que cursou Economia, que trabalhava em banco “carimbando chegue devolvido” e que um dia resolveu largar tudo para se dedicar à arte. Não virou artista plástico porque é muito concorrido. Tornou-se artista popular. E foi protagonista em criações singulares como a Ex-cola de Samba Unidos do Botão e o Fiu Fiu Sport Club, agremiação de assobiadores que já fez passeatas para assobiar a chegada da primavera.

É um curioso personagem este que encontro quando vou à feirinha. Não acho que venda muita coisa lá, embora atraia muita atenção, especialmente das crianças. Mas talvez vender seja, no fundo, outra coisa insignificante.