Para entrar no prédio
Há mais de dois meses eu quebrei o cartão que me autorizava a entrar no prédio em que trabalho. Ele já estava meio rachado, mas um dia se quebrou de vez. Agora, quando chego de manhã cedo e quando volto do almoço, sou obrigado a pedir um cartão de visitante para um dos porteiros. Mas não é simplesmente pedir e sair levando, porque eles não me darão se eu não informar o número da minha carteira de identidade. E de uns tempos pra cá não basta apenas o número, eles querem ainda o estado. De início, eles pressupõem que nasci em Brasília e por isso perguntam com ar de quem já sabe a resposta: “DF?”. Acredito que o DF seja a única unidade da federação que chame a si próprio através de uma sigla. Mas eu entro no jogo deles e também reduzo o meu estado de origem a duas míseras letras: “SC”. Perguntam então para qual sala eu vou e, quando respondo, o computador deles deve exibir um histórico tão grande de entradas que eles observam: “Funcionário, né?”. Confirmo, e só então recebo o cartão, enquanto o porteiro fica pensando por que raios eu não arrumo um pra mim.
De muito bom grado eu arranjaria um novo, se não houvesse visto em casos semelhantes certa resistência empresarial em gastar dinheiro com uma coisa estragada pelo funcionário. Não sei quanto custa um cartão desses, mas deve ser uma fortuna – antes quebrar o cartão de crédito. E também há tantos entraves burocráticos na administração de um condomínio empresarial que é bem provável que até o cartão chegar eu já esteja trabalhando em outro lugar.
Por isso, desde novembro eu sigo, duas vezes ao dia, de segunda a sexta-feira, o mesmo ritual de identificação. Os porteiros já me conhecem de vista e, caso eu fosse mais simpático, provavelmente já seríamos brothers. Mas confesso minha preferência pelas porteiras, especialmente uma que... Enfim. Uma que me atende bem. Apesar disso, sei que não sou correspondido, porque até hoje, depois de dois meses, ela ainda me pergunta todo santo dia: “DF?”.