O Atendente
Em um Starbucks do Jardim Paulista, um atendente de poucos sorrisos anota pedidos.
- Me vê um capuccino grande, por favor.
- Certo. Nome?
O atendente sonda o freguês de cima a baixo com olhos impacientes.
- Carlos.
- Ok. Se quiser ficar ao lado, ele fica pronto em um instante.
Passam alguns minutos até Carlos receber seu copo e caminhar para a mesa com o corpo inclinado por segurar o jornal com o sovaco esquerdo.
Toma um gole do seu aguado café de charmoso nome italiano e abre satisfeito o seu Estadão. Para seu espanto, não foi a manchete sobre a mais recente maracutaia que o surpreendeu. Lá estava ele. Escrito de caneta preta e letra de fôrma, bem centrado no copo de isopor descartável: “Peitinho”.
Com uma expressão incrédula, Carlos caminha lentamente ao balcão, com uma pergunta franzida no rosto.
- Licença. Esse copo era o meu?
- Você pediu um cappuccino médio?
- Pedi.
- Então é seu.
- E o que isso significa?
Mostra o copo. O que o atendente não esconde o sorriso maldoso.
- Você está me chamando de peitinho? É isso?
Os demais clientes desconectam da Matrix de seus smartphones e tablets, esticando suas orelhas e olhares para acompanhar a história que contarão com onomatopéias para toda sua timeline.
- Desculpe se eu preferi ir com algo mais informal. Um apelido carinhoso, ué.
- Carinhoso??
Antes que completasse o titulo de sua indignação, o atendente já o interrompe.
- Olha amigo, não fui eu que te dei esse apelido. Foi o colégio inteiro, imagino.
A platéia já nem disfarça a curiosidade. Todos os olhos do lugar acompanham o desfecho da história.
- Ei!!
Um cliente se levanta e avança a passos rápidos para o balcão. Segura o copo com a ponta dos dedos, como um ator que mostra o rótulo do refrigerante antes de dar um gole.
Lá estava. “Boca de caçapa”, escrito com letra de fôrma.
Já não tinha o que disfarçar. O café era um silêncio completo. Uma torcida apreensiva e ao mesmo tempo maldosa, ávida por um belo barraco.
- O que está acontecendo? Algum problema?
O gerente interrompe antes do pior acontecer.
- Esse desgraçado escreveu no meu copo, me ofendendo.
- Kléber. Vá para dentro, por favor.
Sem dizer uma palavra, Kléber empurra a porta vai-vem logo atrás e some da vista dos clientes ofendidos.
- Senhores, me desculpem. Ele...
- Você tem que mandar esse desgraçado embora.
- E por justa causa! Eu lá tenho boca-de-caçapa?
Carlos envia um olhar de compaixão ao seu aliado. Mas não evita de reparar que ele realmente tinha uma boca enorme.
O gerente olha fundo para Carlos e faz sua promessa.
- E eu vou demitir. Dou minha palavra. Isso é inadmissível! Onde já se viu? Ofender assim um cliente? É a última vez que ele faz isso. Peço mil desculpas, senhor Peitinho.