Quase não vi mandacaru
Mandacaru quando fulora na seca
É o sinal que a chuva chega no sertão.
Gonzaga e Zé Dantas
Estive, faz pouco tempo, no Ceará, que é a minha terra. De ônibus, atravessei boa parte do seu sertão. Até Iguatu, saindo de Fortaleza, passei por Quixadá, Quixeramobim, Mombaça, Jaguaribe, Russas e outras cidades que estão no chamado polígono da seca.
Em algumas dessas cidades, a seca é braba. Em outros lugares do semiárido cearense a gente ainda vê pequenos açudes e estreitos riachos com água, e uma generosa babugem alimentando os animais que, pacientes, esperam dias melhores.
Quase não vi mandacarus! E muito menos mandacarus "fulorando", sinal que a chuva está chegando, como cantou Gonzaga no Xote das meninas. Das plantas sertanejas, o mandacaru está entre as minhas preferidas. É uma planta solidária; uma planta caridosa...
No seu primeiro livro, publicado em 1928, Rachel de Queiroz, assinando Rita de Queluz, escreveu: "E eu nada encontrei que melhor exprimisse a alma de nossa raça do que o mandacaru bisonho, isolado, de aparência inútil e agressiva, que resiste sozinho aos fogaréus do sol, na tortura da seca, e é a nutrição, a salvação da pobre rês faminta e isolada, quando todas as árvores morrem, a clorofila foge, e a frescura da terra emigra, atraída pelo céu."
Ao longo da estrada, vi vacas, carneiros, cabras e bodes cheirando o chão crestado, na sua luta diária e heroica a procura do que comer e beber.
Não vi cavalos. Eles foram mesmo substituídos pelas motocicletas que, com seus roncos ensurdecedores, assustam inté os resistentes e teimosos calangos, que não estão nem aí para a estiagem avassaladora e malvada. Terminaram por retirá-los da paisagem do sertão, o que sempre me deixou inconformado e triste.
À beira das BRs, vi alguns jumentos, pensativos, denunciando, no seu no seu passo lento e sem destino, a tristeza dos abandonados! Ah, o "jumento, nosso irmão!"
Apesar de cria do sertão, testemunha, portanto, de calamitosas estiagens, ver os animais com fome e com sede, nunca deixou de me constranger e comover.
Mas, recordando as secas brabas que enfrentei, e outras não menos dolorosas que a história conta, a estiagem que, neste instante, machuca o sertão nordestino não é das mais violentas e desumanas. Confesso que já vi coisa muito pior.
Leio que a Natureza está avisando aos profetas das chuvas do Ceará que o sofrimento dos cabeças-chatas, em 2014, pode não terminar, mas será bem menor; suportável.
No começo de março, louvando-se em sinais, tais como o "florescer de plantas; movimentação de insetos e posicionamento dos astros", a água começará a cair.
O Ceará terá um inverno tardio, com chuva a partir de março, e boa perspectiva para quem quer plantar. Esse foi o balanço geral dos profetas das chuvas, recentemente reunidos num encontro estadual, o XVIII, na cidade de Quixadá.
A perspectiva de um razoável inverno não teve, entretanto, a aprovação unânime dos profetas reunidos.
Para Manoel Lucinho de Lima, experiente profeta, "a próxima quadra chuvosa será pior do que a de 2013". E reforçando sua tese: "Esse chuveiro no sul do país não é bom sinal para nós." E conclue: "Mas eu espero que a Natureza esteja mentindo."
E por falar em sinais da Natureza determinantes do maior ou menor volume pluviométrico, abro um parêntese para dizer que quando estive, há pouco mais de três meses, na Europa, passando pelos campos frios de Roterdam e Amsterdam, ouvi da minha guia, o seguinte:
- "Olha, hoje vamos ter muita chuva! Observem que as vaquinhas que nos acompanham nessa nossa excursão, estão todas deitadas. Para os holandeses isso é prenúncio de muita chuva."
Seria a opinão dos profetas das chuvas daquela parte do mundo? O certo é que não deu outra: o "tempo instável" foi se confirmando à proporção que meu ônibus cortava as belíssimas rodovias da velha e ousada Holanda.
Mas vamos acreditar no que diz a maioria dos profetas das chuvas do Ceará, ou seja, que 2014 será um ano "bom para plantar". Esperemos março chegar.
Mandacaru quando fulora na seca
É o sinal que a chuva chega no sertão.
Gonzaga e Zé Dantas
Estive, faz pouco tempo, no Ceará, que é a minha terra. De ônibus, atravessei boa parte do seu sertão. Até Iguatu, saindo de Fortaleza, passei por Quixadá, Quixeramobim, Mombaça, Jaguaribe, Russas e outras cidades que estão no chamado polígono da seca.
Em algumas dessas cidades, a seca é braba. Em outros lugares do semiárido cearense a gente ainda vê pequenos açudes e estreitos riachos com água, e uma generosa babugem alimentando os animais que, pacientes, esperam dias melhores.
Quase não vi mandacarus! E muito menos mandacarus "fulorando", sinal que a chuva está chegando, como cantou Gonzaga no Xote das meninas. Das plantas sertanejas, o mandacaru está entre as minhas preferidas. É uma planta solidária; uma planta caridosa...
No seu primeiro livro, publicado em 1928, Rachel de Queiroz, assinando Rita de Queluz, escreveu: "E eu nada encontrei que melhor exprimisse a alma de nossa raça do que o mandacaru bisonho, isolado, de aparência inútil e agressiva, que resiste sozinho aos fogaréus do sol, na tortura da seca, e é a nutrição, a salvação da pobre rês faminta e isolada, quando todas as árvores morrem, a clorofila foge, e a frescura da terra emigra, atraída pelo céu."
Ao longo da estrada, vi vacas, carneiros, cabras e bodes cheirando o chão crestado, na sua luta diária e heroica a procura do que comer e beber.
Não vi cavalos. Eles foram mesmo substituídos pelas motocicletas que, com seus roncos ensurdecedores, assustam inté os resistentes e teimosos calangos, que não estão nem aí para a estiagem avassaladora e malvada. Terminaram por retirá-los da paisagem do sertão, o que sempre me deixou inconformado e triste.
À beira das BRs, vi alguns jumentos, pensativos, denunciando, no seu no seu passo lento e sem destino, a tristeza dos abandonados! Ah, o "jumento, nosso irmão!"
Apesar de cria do sertão, testemunha, portanto, de calamitosas estiagens, ver os animais com fome e com sede, nunca deixou de me constranger e comover.
Mas, recordando as secas brabas que enfrentei, e outras não menos dolorosas que a história conta, a estiagem que, neste instante, machuca o sertão nordestino não é das mais violentas e desumanas. Confesso que já vi coisa muito pior.
Leio que a Natureza está avisando aos profetas das chuvas do Ceará que o sofrimento dos cabeças-chatas, em 2014, pode não terminar, mas será bem menor; suportável.
No começo de março, louvando-se em sinais, tais como o "florescer de plantas; movimentação de insetos e posicionamento dos astros", a água começará a cair.
O Ceará terá um inverno tardio, com chuva a partir de março, e boa perspectiva para quem quer plantar. Esse foi o balanço geral dos profetas das chuvas, recentemente reunidos num encontro estadual, o XVIII, na cidade de Quixadá.
A perspectiva de um razoável inverno não teve, entretanto, a aprovação unânime dos profetas reunidos.
Para Manoel Lucinho de Lima, experiente profeta, "a próxima quadra chuvosa será pior do que a de 2013". E reforçando sua tese: "Esse chuveiro no sul do país não é bom sinal para nós." E conclue: "Mas eu espero que a Natureza esteja mentindo."
E por falar em sinais da Natureza determinantes do maior ou menor volume pluviométrico, abro um parêntese para dizer que quando estive, há pouco mais de três meses, na Europa, passando pelos campos frios de Roterdam e Amsterdam, ouvi da minha guia, o seguinte:
- "Olha, hoje vamos ter muita chuva! Observem que as vaquinhas que nos acompanham nessa nossa excursão, estão todas deitadas. Para os holandeses isso é prenúncio de muita chuva."
Seria a opinão dos profetas das chuvas daquela parte do mundo? O certo é que não deu outra: o "tempo instável" foi se confirmando à proporção que meu ônibus cortava as belíssimas rodovias da velha e ousada Holanda.
Mas vamos acreditar no que diz a maioria dos profetas das chuvas do Ceará, ou seja, que 2014 será um ano "bom para plantar". Esperemos março chegar.