Quatro e quarenta e cinco
Ela vivia sonhando. Não com o príncipe encantado que parecia nunca vir. Ela sonhava que caía num precipício que se chamava amor. O sonho começava numa sala da aula de matemática e terminava na felicidade dela. Ô menina de má sorte! No sonho o precipício era divido em duas partes. A primeira, cheia de flores e a segunda, escura e grotesca. Por isso ela deu esse nome ao precipício. O grande amor que ela viveu, antes era flores e tudo mais. Depois se tornou o mais alto dos prédios onde aqueles suicidas se jogavam.
No final do precipício, tinha um príncipe. Na verdade não era um príncipe. Era só um gordinho que sempre gostou dela. Por que ela sonhava com ele? Ninguém sabe. Ela só sabia que vinha uma voz narrando tudo o que ela sentia. Que nem naquele filme. Aí chegava um unicórnio e levava ela prum castelo de açúcar e rodeado daquelas tiras doces que vende no mercado da esquina.
Do castelo saía um mago que a transformava no que ela sempre quis ser: a Rita Lee. Versão jovem é claro. Daí vinha um tal de Jim Morrison e começava a cantar. Ô sonho sem noção! Tinha também um relógio que a cada toque era um grito de mulher que tava dando à luz. Quatro horas da manhã de domingo. Do mesmo castelo saía também certa modelo que perdeu o corpo e a noção de tudo. Essa modelo começava a cantar Clarice Falcão.
Então eles a levavam para tal cinema cujo dono era mudo. Passou um filme curto, mas até legal. No quase final do sonho, aparecia um cara bem bonito. Ele diz que ela não é feliz no final. Ela não entende e ele se aproxima cada vez mais. No momento do bom e não tão velho beijo, o filme acaba e a última coisa que aparece na tela do cinema é aquele tal de “The End” que tanto me irrita.
Daí começa uma música dos Mamonas Assassinas que dizia alguma coisa sobre a porra da hipotenusa. O cara começava a rir, o gordo começava a rir, o unicórnio relinchava, e o mago dizia umas palavras que ela não lembrava bem. O relógio anunciava as quatro e quarenta e cinco da manhã de domingo com o grito que ela entoou quando acordou.
E a última visão dela era um cartaz que dizia que a felicidade não é duradoura o bastante para o Sol de domingo. Ela tentava entender o que aquilo queria dizer. Ô menina burra! Queria dizer sei lá o quê que o sonho não é meu. Ou é?