A lactose e o amor

Que o mundo anda cada vez mais intolerante é coisa sabida e bem atestam todos os gastroenterologistas. Algumas estatísticas dão conta de que até 70% dos brasileiros adultos não toleram, não suportam e não podem conviver amistosamente com a lactose. E nem é possível dizer que se trata de preconceito, pois há fortes argumentos intestinais a favor dos intolerantes. Pessoalmente, não tenho posição muito definida sobre o assunto, pois o meu exame deu no limite – isto é, eu até consigo tolerar, mas é possível que de vez em quando eu me encha e não tolere mais. O contrário também é verdadeiro, pois conheço algumas pessoas que não podiam suportar a simples presença da lactose, mas depois de um tempo o organismo reviu o seu posicionamento e, mostrando grande flexibilidade, passou a aceitá-la sem maiores constrangimentos. Ao meu redor, no entanto, tenho um punhado de pessoas que, por mais que se fale bem a seu respeito, não conseguem engolir a lactose de jeito nenhum.

Marina, por exemplo. Até pouco tempo, Marina convivia muito bem com os açúcares do leite. Mas as pessoas mudam e, houvesse um grupo de proteção aos direitos dos glicídios, Marina seria hoje acusada de lactofobia – que não parece, mas existe. Acontece que há alguns dias eu almocei na casa de Marina. Depois de nos saciarmos, ela perguntou se eu não achava que cairia bem alguma coisa doce de sobremesa, com o que imediatamente concordei. E o doce em questão não era outra coisa senão um delicioso sorvete de flocos.

De início nem me ocorreu que aquilo tinha lactose e que Marina precisava de um remedinho para poder comer sem maiores consequências. Perguntei se havia alguma contraindicação para aquele remédio e ela disse que não. Isto é, apenas que se você tomar demais ele acaba perdendo o efeito. Refleti que ela estava achando aquela situação digna de se tomar um comprimido. E concluí então que tomar remédio contra intolerância à lactose também é, pois, um jeito de se dizer eu te amo.

milkau
Enviado por milkau em 14/01/2014
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