GERÚNDIO (li sua carta)

O sol está quente apesar do frio, é outono. Dia das mães cai sempre no domingo, li sua carta. Aceitei o convite de entre as linhas porque era uma suplica, reparos nada – opinião talvez. Todo mundo faz cara feia para o gerúndio, mas estou existindo. Percebo que minha alma busca, a face de Deus busca o sol? Soube com clareza hoje que tudo é correspondente, e existe assim: “cada coisa pode ainda ser tudo porque nunca está pronto”. Penso cada coisa. O inteiro de tudo está em movimento, e cada parte do inteiro tem movimento diferenciado. Que bobagem. A vida é o desejo de anular as distâncias, desejo acentuado de aproximação. Que angústia, essa pressa. Dar cabo ao projeto, ver inteira a alma se mover. Cada coisa. Eu acredito que você esteja o tempo todo inconsciente do contato com a possibilidade. Aqui é origem, você apalpa o evidente. Eu queria ver com seus olhos, quando penso isso outro verbo pede complemento e tudo estanca. Espero, deixo de respirar. Ainda é outono, e o sol. Não era essa a pergunta que gostaria de responder: o quanto existo? Qualquer pergunta implica não saber a proporção de espaço entre as possibilidades, que sei eu além de estar sendo incômodo insistir no gerúndio? Se eu pudesse, diante da escolha, gostaria. Aceitar sem refletir é entrever. Antecessores, sempre e antes, é a manifestação da arrogância – fazer o que, humildade intelectual não é burrice? Talvez seja dia das mães e ninguém me avisou. Voltei ao começo do círculo, reconheço que me perdi porque já passei por aqui. Estar sendo é insistência refrigeradora, uma brisa leve. Mas que ideia, quem inventou o dia das mães?

Baltazar Gonçalves
Enviado por Baltazar Gonçalves em 13/01/2014
Reeditado em 15/08/2014
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