O valor da simplicidade

     Não sou, como milhares, um leitor apaixonado do Paulo Coelho, embora não hesite em reconhecer o valor da sua obra literária.
     Não me sinto, porém, intelectualmente diminuído quando digo que, do Paulo, até agora, se me não engano, só li dois livros.
     Confiando, porém, no que diz a crítica especializada, preparo-me para ler Adultério, seu novo livro, com lançamento previsto para abril deste ano, pela Sextante, sua editora.
     Sou, entretanto, admirador dos artigos e crônicas que ele publica nos jornais e revistas.      Ele conta pequenas histórias que, além de muito interessantes, são repletas de sabedoria, que ele sabe, como ninguém, ir buscar no baú dos pensadores e escritores consagrados.
     Nessas histórias contadas pelo Paulo se extrai sempre uma boa lição de vida.

     Muito bem. Os jornais desta semana trazem uma dessas historinhas. Recortei-a e caloquei-a na minha pasta de recortes de bons escritos. o país. Mas logo me veio aquela vontade, aquele desejo de levá-la àqueles que por isso ou aquilo não leem com frequência a coluna do Paulo, publicada  nas gazetas de todo
,     O título - O Jogral de Nossa Senhora - pode não ser chamativo, mas a história mostra o valor da simplicidade, virtude tão esquecida nos tempos que correm.
     Permitam-me os leitores transcrevê-la na integra, posto que, em fragmentos, em pedaços estaria correndo o risco de mutilar a mensagem, que me parece oportuna e belíssima.

                    "O Jogral de Nossa Senhora

     Conta uma lenda medieval que, com o Menino Jesus nos braços, Nossa Senhora resolveu descer à Terra e visitar um mosteiro. 
     Orgulhosos, todos os padres fizeram uma grande fila, e cada um postava-se diante da Virgem, procurando homenagear a mãe e o filho.
 
    Um declamou belos poemas , outro mostrou suas iluminuras para a Bíblia, um terceiro disse o nome de todos os santos. E assim por diante, monge após monge mostrou o seu talento e sua dedicação aos dois.
     No último lugar da fila havia um padre, o mais humilde do convento, que nunca havia aprendido os sábios textos da época.
     Seus pais eram pessoas simples, que trabalhavam num velho circo das redondezas, e tudo que lhe haviam ensinado era atirar bolas para cima e fazer alguns malabarismos.
     Quando chegou sua vez, os outros padres quiseram encerrar as homenagens porque o antigo malabarista não tinha nada de importante para dizer, e podia desmoralizar a imagem do convento.
     Entretanto, no fundo do seu coração, também ele sentia uma imensa necessidade de dar alguma coisa de si para Jesus e a Virgem.
     Envergonhado, sentindo o olhar reprovador dos seus irmãos, ele tirou algumas laranjas do bolso e começou a jogá-las para cima, fazendo malabarismo - que era a única coisa qye sabia fazer. 
     Foi só neste instante que o Menino Jesus sorriu, e começou a bater palmas no colo de Nossa Senhora. E foi para esse que a Virgem estendeu os braços, deixando que segurasse um pouco a criança."

     São assim as histórias do Mago; tão bem contadas que, de repente, a ficção se transforma numa irretorquível realidade;  a mentira em irrefutável verdade; verdade eterna, como dizia Nelson Rodrigues, o Anjo Pornográfico.

 
Felipe Jucá
Enviado por Felipe Jucá em 12/01/2014
Reeditado em 20/04/2021
Código do texto: T4646708
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