Derradeiro texto

Derradeiro texto

Deixarei o papel em branco, por algum tempo, e guardarei a caneta. Preciso de tirar férias, principalmente, de mim, pois, certamente, sou o pior patrão que posso ter. Sempre me fiz escrever amiúde e jamais tive tempo para amores furtivos e nem hiatos para atos frívolos. Necessito de me exilar e cair no ostracismo de mim mesmo, talvez, dessa maneira, eu esqueça os versos da poesia e não seja mais perseguido, à noite, pelas palavras.

Quero, agora, o silêncio sepulcral, misantropo e um mundo tangível. Descerei das nuvens – não serei mais um nefelibata -,perderei minhas asas e caminharei, caminharei, caminharei... Andarei com os pés no chão e comprarei sonhos capitais de um mundo real. Não quererei, por enquanto, as olheiras e nem a mão trêmula cansada por colher a palavra que negou a germinar.

Algum aventureiro que tome o meu lugar, mas, pense bem, pois a palavra não marca horário para se apresentar e, tampouco, aceita intervalos fora de propósitos.

Durante a minha vida, escrevi e respirei e, porém, não sei, das duas funções, qual é a responsável por ter me trazido vivo, até aqui. Deixa pra lá!

Comprarei uma passagem para a vida normal, na qual, escreverei, nos livros de ponto, o meu consumismo e comprarei, do mundo, a minha nova caminhada.

A porta estará sempre aberta para a palavra e sei que ela estará a minha espera. A palavra e eu somos parceiros, companheiros; vivemos, vivenciamos, apagamos e escrevemos o viés da vida. Agora quero sorvê-la, tragá-la e não mais regurgitá-la.

Para aqueles a quem eu ofendi com minha sintaxe esdrúxula, sorriam. Terão, enfim, o descanso, covardes! Comemorem a tábula rasa e vociferem, pelos botecos, que o poeta se foi. Soltem fogos e praguejem sobre os meus rascunhos. Agora, cuidado! Mesmo calada, a minha caneta pulsa.

Para aqueles a quem o verso adocicou a vida, deixo o idílio das rimas que já foram publicadas e ainda ecoam de emoção.

De mais a mais, estou com o passaporte na mão e a passagem é para logo ali; alhures.

Mala pronta, vil metal no bolso e lá vou eu. Estou de férias, pela primeira vez! Férias de mim. Como é bom me esquecer e me achar e me esquecer e me achar...

Já ando mais esguio sem o peso das reflexões. Já estou sentindo até o chão. Estou na terra, finalmente! Só não quero as “verdades” estabelecidas e nem o discurso milenar dos fracos.

De longe, olharei as palavras que proferi e ouvirei, como um anônimo, as críticas que elas me impuseram a receber. As últimas pedras serão arremessadas agora. Atirem-nas, logo!

De hoje em diante, estarei só! A palavra sempre me acompanhou e jamais me deixou caminhar vazio. Agora, ficarei só!

Tenho que partir, o transporte para o mundo já está de saída.

Lá vou eu...

Um dia, voltarei com minhas erínias.

Evoé

Mário Paternostro